A falsa religiosidade (Chico Machado)

Terça feira da 28ª Semana do Tempo Comum. O mês das missões segue acontecendo, com a nossa caminhada rumo ao horizonte do Reino de Deus, que precisa acontecer e ser construído no meio de nós. É missão de todos nós, dar continuidade na história à proposta trazida por Jesus, entretanto, sem nos esquecermos de que estamos no ano jubilar. Também conhecido como Ano Santo, é um evento especial na tradição judaica e cristã, geralmente celebrado a cada 25 anos. Se atentarmos para a originalidade do judaísmo, era um tempo de libertação que incluía o perdão de dívidas e a restituição de terras. Já para a Igreja Católica, é um período de graça, reconciliação, perdão, renovação da fé e intensificação da esperança, com eventos como o Ano Jubilar Ordinário de 2025, cujo tema é “Peregrinos de Esperança”.

14 de outubro, mais uma data importante no nosso calendário eclesial. No dia de hoje, no ano de 1952, estava sendo fundada a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Já são 73 anos de vida, daquela que foi criada no palácio São Joaquim, no Rio de Janeiro, onde ocorreu também a eleição da comissão permanente encarregada de dirigir a entidade, constituída por dom Alfredo Vicente Scherer, dom Mário de Miranda Vilas Boas e dom Antônio Morais de Almeida Júnior. O idealizador desta conferência foi Dom Helder Câmara, então bispo auxiliar do Rio de Janeiro, que foi designado seu secretário-geral, e o cardeal Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta, então arcebispo de São Paulo, que foi eleito o primeiro presidente da entidade, função que exerceu por dois mandatos (1952 a 1958).

A CNBB é considerada a terceira maior conferência episcopal do mundo reconhecida pela Santa Sé. Segundo o Código de Direito Canônico, a conferência episcopal “é um organismo permanente, uma reunião dos bispos de uma nação ou determinado território, que exercem conjuntamente certas funções pastorais em favor dos fiéis de seu território, a fim de promover o maior bem que a Igreja proporciona aos homens principalmente em formas e modalidades de apostolado devidamente adaptadas às circunstâncias de tempo e lugar, de acordo com o direito” (cân. 447). Já o Concilio Vaticano II, deu um novo impulso às Conferências Episcopais, incentivando-as a serem “uma contribuição de muitas e frutíferas maneiras para a realização concreta do espírito colegial”, reforçando a necessidade de uma linguagem mais moderna para os ensinamentos da Igreja. Embora as conferências não tenham uma autoridade doutrinária própria, elas têm um papel crucial na promoção da fé e na coordenação pastoral, auxiliando os bispos em suas dioceses, especialmente na defesa de temas como a dignidade humana, a família e a liberdade religiosa.

Bons tempos da CNBB, cujos bispos tinham uma atuação profética, em defesa dos direitos humanos, fazendo o enfrentamento de uma ditadura, que perdurou por longos 21 anos (1964-1985), com a vigência de um regime autoritário, estabelecendo a censura à imprensa, restrição aos direitos políticos e perseguição (inclusive de bispos) opositores do regime. A entidade foi de fundamental importância, numa crítica contundente aos anos de chumbo, com a participação decisiva de Dom Aloísio Lorscheider, Presidente de 1971 a 1979. Ele foi arcebispo de Fortaleza (CE) e atuou na defesa dos direitos humanos durante a ditadura militar. Também Dom Ivo Lorscheiter, Presidente de 1979 a 1987. Ele também foi uma figura de oposição ao regime militar.

Já na perspectiva da reflexão litúrgica, seguimos com a leitura orante do capitulo 11 do evangelista São Lucas. Um texto bastante significativo, com Jesus sendo convidado por um fariseu para jantar consigo em sua casa. No tempo de Jesus, sentar-se à mesa era uma prática comum para a comunidade judaica. Era considerado um ato de comunhão, associação e confiança, que ocorria em refeições, que geralmente aconteciam no chão, com as pessoas recostadas e mesas baixas em forma de “U”. Para a tradição judaica, a mesa era um local de encontro social e espiritual, onde se compartilhava o alimento físico e a palavra. Sendo um lugar de encontro, naquele contexto, Jesus utilizava a mesa para interagir com seus discípulos, ensinando, contando histórias e compartilhando refeições, pois era um lugar de intimidade e comunicação. Entretanto, trata-se de uma refeição na casa de um fariseu.

Jesus não se intimida diante daquele contexto e, na frente de seu convidado, fala coisas pesadas acerca da conduta daquele, que parecia viver com fidelidade às coisas de Deus. Lembrando que os fariseus eram conhecidos por se tornarem observantes de regras e passaram a criticar, julgar e condenar todos os que não viviam de acordo com as interpretações criadas por eles. Jesus desmascara os donos da estrutura antiga, porque eles deixam de lado a justiça, o amor e a misericórdia de Deus e, para esconder roubos e maldades, se refugiam atrás de todo um aparato de falsa religiosidade. Como se consideravam os especialistas em leis, os fariseus se apossam da chave da ciência, isto é, interpretavam as leis de acordo com seus próprios interesses, exercendo assim um controle ideológico sobre o povo, impedindo-o de ver as possibilidades de transformação. Contra aquela gente, em outro momento, Jesus assim se referiu a eles: “Ai de vocês, mestres da lei e fariseus, hipócritas! Vocês fecham o Reino dos céus diante dos homens! Nem vocês entram, nem deixam entrar aqueles que desejam”. (Mt 23,13)