Reflexões Bíblicas

A pedagogia do amor (Chico Machado)

Sábado da Quinta Semana da Páscoa. Enquanto o tempo pascal vai se delineando, vamos trilhando o caminho da história. O bom de refletir o texto bíblico, de forma encarnada, é saber que estamos inseridos neste contexto, dada a fé que professamos. Uma leitura orante do texto bíblico nos possibilita enxergar as encruzilhadas de nossa caminhada, com esperança de que o Senhor caminha conosco e os desafios, por mais complexos que possam ser, os encararemos sempre de cabeça erguida, projetando o horizonte de nossas utopias. A Palavra de Deus deve ser sempre a nossa inspiração de esperançamento, como um de nossos maiores biblistas, assim afirma: “A Bíblia foi escrita pra gente descobrir Deus na vida da gente”. (Carlos Mesters)

10 anos se passaram. No dia de hoje a Encíclica Laudato Si, do Papa Francisco, faz aniversário. Ele que escreveu quatro Encíclicas: “Lumen fidei” (29 de junho de 2013), “Laudato si” (24 de maio de 2015), “Fratelli tutti” (3 de outubro de 2020) e Dilexit nos (24 de outubro de 2024). Hoje relembramos a Carta do cuidado e da ternura da Terra e suas criaturas. Um documento profético que dá voz ao grito da Terra, não só na sua urgência de escapar da destruição, mas de mostrar a Criação como uma maravilha dadivosa, como dom do Criador. Nossa Casa Comum está agonizando e pede socorro: “A nossa casa comum se pode comparar, ora a uma irmã, com quem partilhamos a existência, ora a uma boa mãe, que nos acolhe nos seus braços” (LS nº 1).

Nossa Casa Comum, que perdeu um de seus humanistas e entusiastas, retratando-a com a sua fotografia. Encantou-se ontem em Paris, Sebastião Ribeiro Salgado Júnior (1944-2025). Nascido no Vale do Rio Doce, no município mineiro de Aimorés, foi um fotógrafo documental e fotojornalista, dedicando-se mais de 50 anos à sua arte, expressando a dignidade e integridade de seus retratados, sobretudo do Terceiro Mundo. Quem o conheceu, sabe que a sua fotografia, transmite-nos uma compreensão sutil de situações sociais e econômicas, raramente encontradas em representações de temas semelhantes feitas por outros fotógrafos. Em tempos de “amizades digitais”, mais que presenciais, onde as pessoas se especializaram em retratar a si mesmas, com os seus sorrisos amarelados, contrafeitos, Sebastião Salgado vai fazer muita falta com a sua câmera.

Ainda bem que o nosso evangelista do dia, segue com a sua amorosidade, ensinando-nos os caminhos que nos conduzem à pedagogia do amor de Jesus de Nazaré. “O discípulo que Jesus amava” (Jo 21,2), é desta forma que João define a si mesmo. Esta característica fundante do amor ficou conhecida e perpassa todo o seu Evangelho. Mais do que os demais evangelistas sinóticos, João assumiu esta condição na história da salvação, descrevendo de forma muito particular a humanidade de Jesus. Em função disto, seus escritos receberam várias denominações significativas: “A flor dos Evangelhos”, “Evangelho espiritual” ou “Evangelho do Logos”, graças à perfeição da sua linguagem teológica e à invenção do termo polissêmico “Logos”, para indicar Jesus, com diversos significados: “Palavra”, “diálogo”, “projeto”, “Verbo”.

É desta forma, que ele nos descreve o texto que a liturgia nos preparou para este sábado. A pedagogia do amor se contrapondo à pedagogia do ódio e tudo aquilo que este representa, desqualificando a essência do ser humano, criado a partir de uma relação de amorosidade infinita de Deus. No texto de hoje, podemos ver que, no mundo está presente as duas forças que se contrapõem: amor e ódio. Este último jamais vencerá, porque a força maior do Criador é movida pela infinitude do amor. Contudo, Jesus faz o alerta a todos os seus seguidores e seguidoras, para que estes fiquem atentos, diante da realidade que viverão, ao fazerem a clara e objetiva opção pelo seguimento d’Ele: “Se o mundo vos odeia, sabei que primeiro me odiou a mim”. (Jo 15,18)

Só o amor constrói! Somente através do amor, a vida acontece. Claro que não estamos falando apenas de um sentimento interior fugaz, definido por palavras, mas da essência que constitui a vida humana. O amor está em nós como característica intrínseca de nossa criação. Nascemos prontos e definidos para amar e, se ódio passou a existir em nós, foi porque assim aprendemos nas encruzilhadas errantes da nossa vida. O ódio não aparece no nosso DNA criacional de Deus, mas foi implantado em nossa mente e coração, pelos descaminhos que fomos escolhendo para viver. O sinal concreto em nosso ser nos vem do amor de Jesus por nós. De outro lado, o sistema de poder que organiza a sociedade e seus adeptos (o mundo) reage ao amor com o ódio, pois não aceita os valores transmitidos por Jesus. Desta forma, não existe possibilidade alguma de conciliação entre este ódio do mundo e a proposta de Jesus. A força do ódio contra o amor cresce, porque os odiosos não aceitam o Deus de Jesus, que denuncia a perversidade da sociedade injusta e liberta os oprimidos da força da morte.

Luiz Cassio

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