As muitas portas tentadoras (Chico Machado)

Quarta feira da 30ª Semana do Tempo Comum. O mês missionário está caminhando para o seu fim. Para a Igreja Católica, o mês de outubro é dedicado às missões, que são vistas como parte essencial da identidade cristã. O mês de outubro é celebrado assim desde 1926, quando o Papa Pio XI, instituiu o Dia Mundial das Missões, que é celebrado sempre no terceiro domingo de Outubro. A cada ano, este mês traz uma temática diferente, como objeto para a nossa reflexão. Como já sabemos, para este ano de 2025, o Papa Francisco havia proclamado o “Jubileu da Esperança”, referindo-se ao Jubileu Ordinário da Igreja Católica, com o tema: “Peregrinos da Esperança”. Lembrando que o ano jubilar acontece a cada 25 anos, que é um período de graça e perdão, destinado a inspirar conversão e renovar o compromisso com a fé. Como reafirmou o Papa Francisco: “o Jubileu é um tempo de esperança, graça e renascimento, uma ocasião para encontrar Deus e o próximo e para transformar vidas”.

Renascimento que também podemos ter com a prática de uma boa leitura, ainda mais sabendo o que comemoramos também na data de hoje: o Dia Nacional do Livro. Diferente do Dia Mundial do Livro, celebrado no dia 23 de abril, proclamado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), desde 1995. A escolha da data do Dia Nacional do Livro deu-se em homenagem ao dia em que também foi fundada a Biblioteca Nacional do Brasil, localizada no Rio de Janeiro, então capital do Brasil a época, quando a Real Biblioteca Portuguesa foi transferida para a colônia, em 1810. Importante saber que o livro é de fundamental importância, por se tratar de uma das fontes de conhecimento e o desenvolvimento pessoal, pois a leitura engrandece a alma, expande o vocabulário e o senso crítico. Como diria o poeta gaúcho Mário Quintana (1906-1994): “Os verdadeiros analfabetos são os que aprenderam a ler e não leem”.

“O livro é a sobrevivência da árvore que não morreu em vão”. Recordo-me sempre desta frase, desde quando entrei pela primeira vez na biblioteca da PUC de Campinas, quando cursava a Filosofia. Sempre tive bons livros acompanhando a minha trajetória de vida. Ler se transformou num hábito frequente, graças à formação e orientação que tive com a minha professora Zilda, de literatura, lá pelos idos de 1976, quando dei entrada no seminário Santo Afonso, em Aparecida/SP. Nunca abandonei os bons livros. Eu não seria quem sou, sem os livros que tive oportunidade de ler, na vasta biblioteca que tínhamos a disposição no seminário. Mais tarde fui perceber que estava no caminho certo, quando deparei com os escritos de Paulo Freire (1921-1997), reforçando: “É preciso que a leitura seja um ato de amor. Ensinar a ler é engajar-se numa experiência criativa em torno da compreensão”.

Boa e imprescindível leitura que fazemos hoje com o texto do Evangelho de Lucas, que a liturgia nos oferece, como perspectiva de reflexão. Ler o texto para ter uma compreensão maior acerca da mensagem que Jesus quis transmitir aos seus discípulos, ali naquele contexto, em que eles estavam indo rumo à Jerusalém. Diante da pergunta de alguém anônimo, sobre a possibilidade de salvação, Jesus não responde diretamente, mas dá uma dica: “Fazei todo esforço possível para entrar pela porta estreita. Porque eu vos digo que muitos tentarão entrar e não conseguirão”. (Lc 13,24) Não entrarão porque são muitas portas que se abrem no universo da nossa existência: a porta do comodismo, da indiferença, do egoísmo, da vida fácil, da ganância, do cada um pra si… A porta estreita da qual se refere Jesus é a porta da prática da justiça do Reino.

Encontrar o caminho que nos leva a esta porta estreita, é o segredo que nos dá a possibilidade de adentrá-la e por ela chegar à perspectiva do Reino de Deus. Todos e todas, somos convidados/as a passarmos por esta porta estreita, mas alguns de nós preferirão entrar por outras portas alheias. A liberdade de escolha é concedida dentro do contexto das opções que cada um faz para a sua vida. Aqui entra o conceito amplamente debatido na filosofia, na ciência e na religião de modo geral, que é o “Livre-arbítrio”, definido como a capacidade de tomar decisões independentes, e escolher o próprio caminho, diante das diferentes opções que se tem. Entrar pela porta estreita é a condição colocada por Jesus, pressupondo o compromisso que devemos ter com a vida e a justiça que se faz para todos.

Quem entra pela porta estreita sabe, de antemão, que deverá assumir o compromisso de escolher o caminho da vida que cria a nova história. Entrar por esta porta estreita nos dá a certeza de saber que Deus tem sonhado os seus sonhos, tem planejado os seus planos e tudo aquilo que não for bom para nós, Ele está oferecendo algo melhor. Isto significa que Deus tem uma nova história, um novo tempo. Certamente que, nesta caminhada, nos depararemos com as nossas perdas, nossos fracassos, nossas quedas, mas devemos ter a convicção de que tudo isso nos servirá de instrumentos, para continuar nesta caminhada, de quem entra pela porta estreita. Com este texto de hoje Jesus nos ensina que a opção fundamental é pelo Reino e sua justiça (entrar pela porta), como continuar nessa busca fundamental (caminho), que não são nada fáceis. Esta escolha nunca será feita pelos indecisos e acomodados. Estes ficarão relutando, ou escolhendo a porta mais larga oferecida pelos ídolos de sempre.