Reflexões Bíblicas

Fé que nasce da esperança em forma de gratidão (Chico Machado)

Quarta feira da 32ª Semana do Tempo Comum. Uma quarta feira em que a chuva começou cedo, aqui pelas bandas do Araguaia. Uma chuva mansa e tranquila desceu do céu, molhando a terra e a nossa esperança. A vegetação, a mata ciliar e também nós, agradecemos pela água sempre bem vinda. Deus sendo generoso para conosco, apesar da nossa maldade em maltratar a obra de sua criação. A natureza a nossa volta por aqui, já se revestiu de novas folhagens, mostrando o seu poder regenerativo. Segundo os estudiosos do meio ambiente, estamos caminhando para uma realidade sem retorno, pois estamos tirando da natureza a oportunidade de regenerar-se, de tão acelerado que está o nosso poder destrutivo.

A esperança deve ser a força primordial que move os nossos corações, atitudes e gestos. Quando não a temos, e dela desacreditamos, significa que vamos perdendo a nossa essência de ser quem somos. É esta esperança que nos faz sermos perseverantes e resilientes diante das adversidades. Sim, porque ela não é apenas um sentimento interior, mas uma força transformadora que nos orienta para a ação, dando-nos coragem para seguir em frente, acreditando no futuro, alcançando novas metas e transformando a dor em vontade de lutar para transformar o meio em que vivemos. Esperança que se mescla com a indignação, diante da injustiça feita aos pequenos, pobres e marginalizados.

Esperança que é a palavra central do texto de Lucas, que a liturgia hoje nos proporciona refletir. Jesus, juntamente com os seus discípulos, está a caminho de Jerusalém, passando pela Samaria e pela Galileia. No tempo de Jesus, a Samaria era considerada um lugar impuro e desprezível. As pessoas que moravam nesta região, eram consideradas traidoras da fé. Um povo terrivelmente discriminado e considerado inferior a outros povos da região. Este povo era tão rejeitado e desprezível, que haviam atalhos que evitavam de passar por aquele lugar. Não é o caso de Jesus, que faz questão de passar com os seus discípulos por ali e se fazer presente com eles.

Já a Galileia, foi a região em que Jesus cresceu. Na época de Jesus, mesmo sendo uma região pobre, era um local movimentado, com muito comércio e transporte por barco. Era também marcada por movimentos messiânicos e por revoltas ocasionais contra o domínio romano. Foi exatamente nesta região, que Jesus concentrou grande parte de seu ministério, sua atividade messiânica, sobretudo, nas cidades e vilarejos ao redor do Mar da Galileia, como Cafarnaum, Betsaida e Magdala. Desta forma, tornou-se o centro das ações de Jesus, como podemos ver registrado no Evangelho de Mateus: “Jesus subiu numa barca, passou para a outra margem e chegou à sua cidade”. (Mt 9,1) Messianismo que este evangelista apresenta Jesus como aquele Mestre que veio realizar a justiça: “devemos cumprir toda a justiça” (Mt 3,15).

A cena apresentada por Lucas hoje é chocante. Dez leprosos vêm ao encontro de Jesus, pedindo a este que os curassem daquela enfermidade a qual padeciam. Lembrando que no tempo de Jesus, a lepra (hoje conhecida como hanseníase), era vista como uma sentença de morte para o doente. Estes eram considerados impuros e, portanto, proibidos de se aproximarem das cidades e pessoas. Eram isolados e excluídos do convívio social, e também da vida religiosa. Ninguém os podia tocar, pois, se assim o fizessem, eram também considerados impuros e contaminados pela doença. A abordagem de Jesus, no entanto, é radicalmente diferente, pois Ele quebrava todas as barreiras sociais ao tocá-los e curá-los, demonstrando acima de tudo, sua compaixão, acolhida e cuidado.

Os dez leprosos são curados por Jesus, mas apenas um deles retorna para agradecer pelo dom da cura. Os demais agem movidos por um sentimento de profunda ingratidão. Jesus não somente os curam, mas os encaminham para que se apresentassem ao sacerdote. Isto porque, segundo a tradição da Lei mosaica, era o sacerdote, pertencente a tribo de Levi, que tinha a função de diagnosticar e, posteriormente, atestar a cura do leproso. Era realizado todo um ritual após a constatação da cura, em que o sacerdote sacrificava uma das aves para aspergir o sangue sobre o indivíduo sete vezes, declarando-o limpo, podendo assim voltar ao convívio social, como está descrito nos capítulos 13 e 14 do livro do Levítico.

O único que voltou para agradecer foi um samaritano. Mais uma vez o ponto alto desta narrativa é a fé de um estigmatizado samaritano. Este dá uma grande demonstração de sua fé. Uma fé madura que nasce da esperança, cresce na obediência à palavra de Jesus e se manifesta na sua imensa gratidão. Este homem marginalizado e discriminado, não somente recebe a cura, mas foi salvo, ouvindo de Jesus, a sentença: “Levanta-te e vai! Tua fé te salvou”. (Lc 17,19) Fé que se manifesta em forma de gratidão. Agradecido por Jesus ter-lhe devolvido a esperança de viver com dignidade de filho de Deus. Como nos dizia Santo Agostinho, “a gratidão é a memória do coração”. Ela que se faz luz a iluminar o caminho de dias melhores do renascer da esperança. “Gratidão é única resposta digna ao dom de Deus!” (Papa Francisco)

Luiz Cassio

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