Nossas Artes

TOPÓGRAFO APRENDIZ FALA DO SANGUE DAS BRUXAS DE AGOSTO (NELSON PEIXOTO)

Gisele B. Braga

O caro amigo idoso e independente, rejeitando o Halloween de vertente americana, revelou-me sobre o dia real das bruxas, segundo a crença de seus companheiros de trabalho em seu passado distante. Eram maranhenses genuínos, nativos de uma história ancestral de muitas gerações com manifestações e elementos culturais africanos e europeus, trazidos, principalmente, por meio das religiões aplicando a pedagogias do medo e do pavor.

Apesar de todas essas heranças acumuladas, homens valentes se tornaram heroicos e incansáveis nas obras de serviço metálico de uma grande empresa de estruturas gigantes, situada a uns 150 km distantes de Tucuruí, no Pará.
Antes de me contar sobre sua experiência de ajudante de topógrafo, foi-me dizendo que o Dia das Bruxas, sedentas de sangue, é o dia 1° de agosto, quando cai numa segunda-feira. Ele jura o que aconteceu na sua própria carne, exatamente numa segunda-feira feira 1⁰ de agosto.

Gisele B. Alfaia

Ele foi contando que a área que demarcaria era de aproximadamente a extensão de Manaus. Duas equipes de 8 homens passaram 8 meses para marcar a área da empresa. Lembrava com vivacidade da preparação da sua equipe.  Amolavam os facões, apertavam o cabo das foices, azeitavam motosserras, ajustavam o teodolito para a precisão das medidas e, então, colocavam mãos e pés na floresta abrindo a picada. Achados os ângulos verticais e horizontais para a medição óptica, caso encontrassem alguma árvore cujo tronco impedisse, entravam em ação com a motosserra, sem piedade, afugentando os macacos e as preguiças, derrubando ninhos, orquídeas e bromélias.

Concluída a marcação de toda a área da empresa e dos lotes, começava a destruição mais dolorosa através de dois imensos tratores de força bruta, que, com duas correntes amarradas em cada um deles, iam pondo abaixo a floresta, arrancando até as raízes das árvores centenárias. Esse era o começo da estratégia, entre outras ações para vender as madeiras de lei que pareciam pouco valer para aquela empresa. Naquele tempo, após a queimada do lote, plantavam eucalipto para levar as fornalhas na produção de material de ferro para a siderurgia, a partir do seixo de rocha com a separação do silício.

Num começo da manhã de 1⁰ de agosto, em uma segunda-feira, houve resistência para trabalhar devido à crença das bruxas, sedentas de sangue. Entretanto, o aprendiz de topógrafo duvidou, mesmo depois que seus colegas maranhenses contaram dos trágicos acontecimentos do dia das bruxas.
Com o facão na mão, começando a tarefa pesada, meu amigo descrente viu passar ao seu lado um veado selvagem que foi esconder-se debaixo de uma árvore cheia de galhos que fora derrubada. Correu com o facão, subiu pelo tronco da árvore e, de cima, posicionou-se para golpear o animal. De repente, o facão escorregou de sua mão, quase decepando-a e jorrando muito sangue.
Espanto geral e confirmação da crença! O sangue para satisfazer as bruxas tinha jorrado! Terror entre os companheiros de trabalho! Na verdade, não havia veado, somente ele teve a visão do animal, que provavelmente era uma bruxa travestida de veado. Todos declararam ser uma bruxa rondando aquela floresta para beber sangue humano. Emudecidos e perplexos, intensificaram a crença antiga e esqueceram as lendas do saci, do curupira e do inocente mapinguari.
Ao final da história que trocou vampiros pela bruxa, sentenciei: “A dor das florestas ceifadas e seivadas de lágrimas reclamou para as bruxas que vieram beber o sangue e consumar a vingança da derrubada das árvores e a vida de toda a fauna e a flora”.

A partir desse momento, começaram a ver uma borboleta seguindo os passos da equipe, até chegar ao acampamento onde havia um pequeno pronto-socorro e um enfermeiro para enfaixar a mão cortada.
Essa história foi contada por quem passou pela experiência e não duvida de que a floresta é cheia de mistérios. Quem experimentou garante que foi verdade, não importa que não acreditem.
Lutemos pela floresta em pé! Diz-se que manter a Floresta Amazônica em pé vale sete vezes mais do que outras atividades econômicas, como pastagens, mineração e exploração de madeira.
NELSON PEIXOTO, 06 de setembro de 2025
Luiz Cassio

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