Quinta feira da 31ª Semana do Tempo Comum. Devagar, a chuva vem chegando também aqui para nós. As queimadas já não seguem na mesma proporção, e a fumaça deu uma trégua. Todos os anos é a mesma coisa, e a natureza vai perdendo parte de seu “modus vivendi”, com a ação destrutiva do homem, que não aprendeu ainda a conviver com esta, sem destruir. A nossa esperança por aqui está quiçá na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), que acontecerá entre os dias 10 e 21 de novembro, aqui próximo de nós, na cidade de Belém, capital do Pará. Que não fique apenas nas decisões em papel que, posteriormente serão engavetados, sem resolubilidade. Gosto da frase dita pelo cientista natural alemão Johann Goethe (1749-1832): “A natureza é o único livro que oferece um conteúdo valioso em todas as suas folhas”.
De cientista para a arte moderna. Neste 310º dia do ano, é vez de lembrarmo-nos de uma das representantes muito significativas de nossa arte. É claro que estamos falando da paulistana Anita Catarina Malfatti (1889-1964). Na data de hoje, ela fazia a sua páscoa. Pintora das boas, desenhista e professora ítalo-brasileira. Apesar de ser uma pessoa com deficiência motora, tornou-se uma das mais importantes personagens da Arte Moderna no Brasil, ao lado de Tarsila do Amaral, entre outros, valorizando a cultura e os temas brasileiros em obras que se caracterizam pela liberdade formal, experimentalismo e crítica social. Participou ativamente da Semana de Arte Moderna, ocorrida no Theatro Municipal de São Paulo, de 13 a 17 de fevereiro de 1922. Este movimento significou a ruptura com o academicismo e a criação de uma identidade nacional, influenciado pelas vanguardas europeias. Anita era tão identificada com a pintura que chegou a dizer: “O dia em que eu parar de pintar pode anotar, eu morro”.
A vida é uma arte em que vamos desenhando em cores adversas a nossa trajetória histórica do existir. Cada dia é uma destas páginas do livro que se abre e que vamos desenhando a nossa arte. Ao final de cada um destes dias, fica registrado aquilo que somos, fazemos, ou deixamos de fazer. Neste sentido, Deus nos permite que façamos as nossas escolhas, sendo que, as consequências destas, virão de alguma maneira. Para os que são cristãos, e tem Jesus como paradigma de seus projetos de vida, somos desafiados a buscar permanentemente a nossa conversão, como forma de adequar a nossa vida ao Mestre em quem nos inspiramos. Converter é a arte cotidiana de quem sabe reconhecer suas limitações, fragilidades e fraquezas, mas que não se deixa abater, por sentir e avistar no seu horizonte, a Pessoa amorosa de um Deus que nos criou para a plenitude da vida.
Conversão que é o tema central que a liturgia de hoje nos desafia refletir com o texto de Lucas. Nele Jesus está sendo criticado veementemente pelos fariseus e mestres da Lei, por acolher e fazer refeição com pecadores, com os publicanos. Lembrando que no tempo de Jesus, os publicanos eram os cobradores de impostos judeus, que trabalhavam para o Império Romano. Por este motivo, eram desprezados pelo povo, por colaborarem com os opressores romanos e, por muitas vezes, serem corruptos, cobrando impostos em excesso e enriquecendo ilicitamente à custa do sofrimento do povo. Desta forma, como o texto de hoje relata, os publicanos eram considerados pecadores, por se misturarem com os gentios e desrespeitarem a lei. Entretanto, Jesus, teve uma atitude diferente ao se aproximar e chamar alguns publicanos, acolhendo-os, mostrando que Ele veio para buscar e salvar exatamente os “perdidos”.
“Haverá alegria entre os anjos de Deus por um só pecador que se converte”. (Lc 15,10) Este versículo último do texto lucano de hoje é a síntese para toda a vida cristã. Como Lucas é o “evangelista da misericórdia”, o capitulo 15 de seu evangelho é considerado o coração de seu texto. Neste capítulo se concentra a mensagem central de sua obra, aproximando ao máximo do Jesus histórico, que é aquele que veio anunciar e se encarnar, no meio da humanidade, trazendo-nos o amor misericordioso, compassivo e gratuito do Pai. Jesus que não somente falava dos pecadores, pequenos, pobres e marginalizados, mas convivia diretamente com eles, no meio deles, se fazendo um com eles, mostrando a face misericordiosa de um Deus amoroso. É este Jesus histórico que os religiosos do tempo de Jesus não o aceitavam, como também os conservadores tradicionalistas de hoje, não o aceitam, pelo fato de sua identificação com os pobres. Jesus, “tão humano assim, só podia ser Deus”. (Leonardo Boff)
“Vinde a mim todos vocês que estão cansados de carregar o peso do seu fardo, e eu lhes darei descanso”. (Mt 11,28) Jesus veio até nós para instaurar o Reino. Os religiosos que estão presos as suas estruturas religiosas de cumprimento rigoroso da Lei, não o reconhecem porque Ele vai às periferias existenciais, geográficas e sociais, fazendo acontecer ali a justiça do Reino de Deus. São os pobres, os desfavorecidos que conseguem penetrar o sentido mais profundo dessa atividade revolucionária libertadora de Jesus. Esta perícope de Lucas de hoje ensina para nós que Deus prefere o pecador ao justo, ou que os que se acham justos, mas estão cheios de hipocrisia nas suas ações. Fica claro que a lógica de Deus é outra, pois com o seu mistério de amor, se alegra muito mais em acolher o pecador arrependido, ao lado do justo que persevera, na sua conversão como caminho de libertação.


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