Vigésimo Sétimo Domingo do Tempo Comum. O mês missionário vai se consolidando dentro de nossa história. O desafio é caminhar “missionando” a nós mesmos, para que assim possamos “missionar” ao outro, trazendo-o para dentro da dinâmica do Reino. Caminhar nesta direção, tendo Jesus como o grande guia que, com a sua Encarnação, veio nos mostrando o caminho, sendo Ele mesmo o Caminho. Encarnação que os teólogos aludem para indicar que Jesus, o Filho de Deus, assumiu a carne humana. Isso é semelhante à união hipostática, que forma uma só pessoa. A diferença é que a união hipostática explica como as duas naturezas de Jesus se unem, e a Encarnação afirma mais especificamente a Sua humanidade entre nós.

O Ser divino de Deus se fazendo humanidade em nossa história. Transcendência e imanência se fazendo ao alcance de nossa realidade humana. Deus visitando a história e vindo estabelecer sua morada definitiva entre o seu povo. Como Zacarias mesmo já havia profetizado, realçado por Lucas: “Louvado seja o Senhor, o Deus de Israel, porque visitou e redimiu o seu povo”. (Lc 1,68) O Deus pleno de misericórdia, que realiza, através de Jesus, a “visita” aos pobres. Em Jesus se manifesta a força que liberta dos inimigos e do medo, formando um povo santo diante de Deus e justo diante dos homens. Desse modo, manifesta-se a luz que ilumina a condição do povo, abrindo uma história nova, que se encaminha para a Paz, isto é, a plenitude da vida.

Rezei nesta manhã em clima de solidão: eu e Deus, Deus e eu! Meus anfitriões me abandonaram nesta manhã. Certamente encontraram algo mais interessante para iniciar o seu dia. Na semana em que celebramos o defensor maior da natureza e dos animais, deixei-me inebriar pelo colorido e o perfume natural das flores, exalando vida. Cada árvore com a especificidade do aroma de sua florada, formando um conjunto dialético, uníssono e transubstancial. Começar o dia permitindo que a alma seja perfumada pela tonalidade das flores, para que o coração navegue nas águas da ternura, e as mãos edifiquem um novo jeito de ser, inspirando no provérbio chinês que assim diz: “Um pouco de perfume sempre fica nas mãos de quem oferece flores”.

Se a missão do cristão é caminhar, estamos caminhando com Jesus que, desta vez, chegou a Jerusalém, conforme nos relata o evangelista Mateus, como proposta da liturgia deste domingo, sequenciando os domingos anteriores: Jesus com as suas parábolas. Já vimos a “parábola do “patrão generoso” (Mt 20,1-16); a “parábola dos dois filhos” (Mt 21,28-32). Hoje estamos diante da “parábola dos vinhateiros homicidas” (Mt 21,33-43). Jesus exercendo o seu ministério em Jerusalém, diante das autoridades religiosas e políticas de Israel. Lembrando que o texto de hoje também aparece nos outros evangelhos sinóticos (Mc 12,1-12; Lc 10,20,9-19), guardadas as especificidades teológicas de cada um deles.

Jesus falando e ensinando com autoridade. Autoridade messiânica delegada pelo proprio Deus: “Toda a autoridade foi dada a mim no céu e sobre a terra”. (Mt 28,18). Não como a autoridade das lideranças religiosas, sumos sacerdotes e anciãos do povo, que utilizavam da religião para explorar e oprimir os pequenos, marginalizando-os, em nome de Deus, ferindo frontalmente um dos mandamentos do Decálogo: “Não tomarás em vão o nome do Senhor, o teu Deus, pois o Senhor não deixará impune quem tomar o seu nome em vão”. (Ex 20,7) O simples fato de falar com autoridade provocava o confronto, pois os religiosos não admitem que alguém vindo da periferia de Nazaré, pudesse ter autoridade para dizer o que quer que fosse: “Esse homem não é o filho do carpinteiro? Sua mãe não se chama Maria?” (Mt 13,55). É impossível que Jesus, sendo um deles, tenha a autoridade de Deus.

O Templo deixou de ser casa de Deus, lugar de oração e acolhida, para se transformar num covil de ladrões. As autoridades que deviam estar a serviço de Deus na pessoa dos empobrecidos, mantinham os seus privilégios, à custa do sofrimento dos pobres. Jesus passa ao ataque fazendo alusão à figueira que não dá frutos, e o Templo que se tornara em lugar de roubo, porque as autoridades (chefes dos sacerdotes, doutores da Lei, anciãos do Sinédrio) exploram e oprimem, apoderando-se daquilo que pertence a Deus, isto é, o povo da aliança (vinha). Depois de muitos profetas que pregavam a justiça (empregados), Deus envia o próprio Filho com o Reino. A rejeição e morte de Jesus trazem a sentença: o povo de Deus, agora irmanado em torno de Jesus (pedra), passa a outros chefes, que não devem tomar posse, mas servir. Esta realidade combatida por Jesus parece ter sobrevivido ao tempo. Entre nós é possível perceber que alguns templos e lideranças religiosas seguem na mesma toada dos sumos sacerdotes e dos anciãos do povo do tempo de Jesus. Não entenderam nada da proposta e dos ensinamentos de Jesus.