Sábado da Segunda Semana da Quaresma. Um tempo mais que especial para a nossa retomada na fé: jejum, oração e caridade. À luz da Palavra de Deus, somos convidados a colocar a nossa vida no centro do projeto de Jesus, traduzindo em miúdos, esta tríplice perspectiva. Jejum, como prática de abster não somente das coisas de comer, mas de tudo aquilo que fere a nossa dignidade como filhos e filhas de Deus: ódio, mentira, rancor falsidade, injuria, difamação. Oração, como a expressão mais profunda de nossa relação com Deus na realidade concreta dos irmãos. Caridade, não de cima para baixo, mas como gesto de solidariedade, empatia e misericórdia, de quem se coloca no mesmo patamar da pessoa a quem nos dirigimos com a nossa ajuda.

“Caridade é tão vertical: vai de cima para baixo. Solidariedade é horizontal: respeita a outra pessoa e aprende com o outro”, dir-nos-ia o jornalista e escritor uruguaio Eduardo Galeano (1940-2015). A palavra caridade se desgastou ao longo dos anos, por isso, urge dar-lhe uma nova roupagem, como deveríamos fazer com os catadores de recicláveis. Ontem comemoramos o Dia do Catador de Materiais Recicláveis. Antes eles eram chamados, maldosamente, de “catadores de lixo”. Pessoas que prestam um grande serviço à nossa sociedade, embora não reconhecidos pelo seu trabalho tão árduo, sujeitos a acidentes, doenças e, inclusive maus tratos, por parte de nossa sociedade. Os catadores prestam um serviço essencial para as cidades, contribuindo assim para as condições de saneamento, limpeza e manutenção dos espaços públicos, sem falar da preservação do meio ambiente. “O que para muitos é lixo, para nós é ouro”, afirmou um dos anónimos catadores. Sejamos solidários às causas deles.

O mês de março, considerado pela Igreja Católica como o mês de São José, embora muitos não saibam, março é também o mês dos novos mártires. Foi por isso que o Papa Francisco, pediu que, nas nossas intenções de oração, rezássemos pelos novos mártires, a quem ele chama de “testemunhas de Cristo”. São muitos os novos mártires nos dias de hoje. A cada dia, está tombando um deles, por causa de sua perseverança e fidelidade ao Projeto do Reino. Quantas vidas inocentes de mulheres e crianças não estão sendo ceifadas, na insanidade daqueles que promovem as guerras, num clamor que sobe aos céus? Como diz o nosso Papa: “Os mártires são o sinal de que estamos no caminho certo”. Mas chega de sangue inocente derramado pelas mãos ensanguentadas dos Senhores de Estado!

Adentrando o terceiro mês do ano, seguimos com a nossa reflexão quaresmal, mirando na Páscoa da Ressurreição. A liturgia de hoje nos propõe um texto do capítulo 15 do Evangelho de Lucas. Lembrando que este capítulo é o coração do evangelho lucano. Nele estão contidas as parábolas contadas por Jesus: “A ovelha perdida” (Lc 15,3-7); ”A moeda perdida” (Lc 15,8-10); “Os dois filhos” (Lc 15,1-3.11-32). Jesus provocando a ira e o escândalo das autoridades religiosas, fariseus e doutores da Lei, porque Ele é acolhido por cobradores de impostos e pecadores em geral: doentes, prostitutas, pagãos, os indesejados, descartados. Jesus se misturando com eles e sentando a mesa para comer, coisa inadmissível à época, ainda mais sendo Ele o Messias enviado.

A parábola do pai amoroso, (filho pródigo para alguns) está entre os textos mais conhecidos e apreciados de todo o Novo Testamento. A relação de um filho rebelde, que se rompe com seu pai, indo à busca de novas aventuras. Quebra a cabeça e percebe que errou feio, entrando numa roubada. Todavia, tem a humildade suficiente para reconhecer que errou, e volta atrás. Só não esperava que o pai o recebesse com tamanha amorosidade, dando-lhe uma nova chance para recomeçar a vida. O pai na sua amorosidade recebe de volta o filho, mostrando que, mais do que a relação de culpa, está o perdão incondicional de quem muito ama. Quem muito ama, muito perdoa! Quem não ama, desconhece o que é perdoar!

Nosso Deus é o Deus da amorosidade infinita em pessoa. Seu Ser divino transcendente é pleno de misericórdia e compaixão, sobretudo para com aqueles e aquelas que erram, mas que encontram o caminho de volta à casa do Pai. Apesar de termos sidos criados à imagem e semelhança de Deus, como o Livro do Gênesis nos descreve (Gn 1,26-28), somos todos e todas pecadores/as. O que nos faz engradecidos é a humildade que nos possibilita reconhecer as nossas fraquezas, fragilidades e limitações. Cabe-nos buscarmos o caminho de volta que nos leva ao Deus da amorosidade, que vai estar sempre pronto a acolher-nos, independentemente das nossas falhas. Que saibamos dizer como o refrão de uma das canções que cantamos no ofertório de nossas celebrações: “Confiei no seu amor e voltei! Sim, aqui é o meu lugar!” O mistério do amor de Deus reside num Pai que se alegra em acolher o pecador arrependido ao lado do justo que é fiel sempre e persevera. “Era preciso festejar e alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e tornou a viver; estava perdido, e foi encontrado”. (Lc 15,32)