Quarto dia da Oitava do Natal. Um olho no Natal que se foi, e outro no ano que está à frente. Uma quinta feira, cujo dia 28 de dezembro, é o 362.º dia do ano do nosso Calendário Gregoriano. Três a mais e já estaremos triunfando no ano que se avizinha. Passou muito rápido, dirão alguns. Fato é que o tempo que passamos por aqui é ligeiramente curto. Lembremos que o tempo não volta, o que volta sempre é a vontade de voltar no tempo.

Celebramos neste dia uma data muito difícil de ser lembrada, pelo contexto em que ela aconteceu. Santos Mártires Inocentes, numa alusão às mais de duas mil crianças, assassinadas pelo rei Herodes, depois de saber pelos magos do Oriente, quando lhe perguntaram, onde havia nascido o Rei dos Judeus. Ameaçado de perder o poder, prestígio e importância, o rei toma tal atitude.

Mais uma tragédia a qual teve que passar o casal de Nazaré, Maria e José, fugindo às pressas para o Egito, a fim de que a sua criança não fosse também assassinada por aquele sanguinário tirano, se sentindo no direito de ceifar a vida de inocentes crianças. A festa de hoje foi instituída pelo Papa São Pio V, ajudando-nos a viver com profundidade este tempo da Oitava do Natal num martirial.

Rezei a oração dos Mártires Inocentes. Num misto de tristeza e alegria, acordei nesta manhã rezando pelo dom da vida do meu amigo Gladistônio, que me acolhe carinhosamente em sua casa, e que no dia de hoje celebra o seu natalício. Tristeza por saber que a história do cristianismo é marcada por uma centena de inocentes, martirizados, ontem e hoje, pelas forças diabólicas da morte, que insistem em querer prevalecer sobre a vida plena que Deus quer para todos.

O coração batendo apressadamente e assustado na capital dos paulistas. O meu ser do mato, não combina mais com a correria da cidade grande. A vida nas aldeias indígenas e a calmaria da mata e dos rios, alojaram em minhas entranhas e não saem mais do meu interior. O pouco que me afasto, coração pede pra voltar. Esta condição me faz lembrar do filósofo francês Blaise Pascal quando diz: “O coração tem razões que a própria razão desconhece”.

“Não se acha a paz evitando a vida “, diria-nos Virgínia Woolf. As vítimas inocentes de ontem e de hoje estão no agendamento dos que se dizem portadores da verdade. As crianças palestinas que o digam. Para nós cristãos, o episódio narrado pelo Evangelho de Mateus sobre os Santos Mártires Inocentes é um exemplo típico de como a sede do poder pode levar a crimes hediondos, atrozes. Os filhos das mães de Belém foram vítimas do ódio impiedoso de Herodes com aqueles que poderiam ter impedido seus planos de poder e domínio.

“Ouviu-se um clamor em Ramá, pranto e grande lamento; era Raquel chorando por seus filhos e inconsolável por causa deles, porque já não existem.” (Jer 31,15) O lugar da Terra Prometida por Deus aos seus, tornou-se um novo Egito, lugar de opressão e morte dos inocentes. Jesus, o Filho de Deus, escapa da fúria possessiva de um ditador. Com isso, Mateus quer nos dizer que Jesus será o novo Moisés. Com sua ação, palavra e missão, vai liderar o processo de libertação das estruturas que oprimem e escravizam, simbolizadas pela Judéia e Jerusalém. Desta forma, a Galileia, terra dos pagãos, pecadores e marginalizados, será o ponto de partida para esse novo êxodo que Jesus realiza através do seu ensinamento e atividade. Basta de sangue inocente derramado. Não queremos mártires. Queremos vida! E vida para todos!