Sábado da Terceira Semana da Quaresma. Para os cristãos, a Quaresma é este tempo favorável para a busca da conversão. Encontrar mecanismos transformadores para as nossas vidas, tendo o amor, a misericórdia, a compaixão, como princípios fundantes da nossa existência. Deixar-nos levar pelo espírito da misericórdia, mirando em Jesus e vendo sua incessante presença junto dos pobres, dos pecadores, das prostitutas, dos rejeitados, dos doentes, sendo presença viva de misericórdia no meio deles. A conversão não é algo pronto e acabado, mas se faz na caminhada de cada dia, quando nos propomos trilhar o mesmo caminho de e com Jesus.

O dia de sábado segue repercutindo as manifestações das mulheres, na sua luta incansável por direitos e igualdade de gênero. Todavia, numa sociedade eclética como a nossa, há contradições gritantes. Nesta quinta-feira 4, por exemplo, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei da Igualdade Salarial entre homens e mulheres. Apesar do apoio à nova lei ter maciço, 36 parlamentares se posicionaram contra o texto em questão. E não é que destes opositores, 10 deles são mulheres? Mulheres votando contra elas mesmas, já que o PL trata diretamente da igualdade salarial entre gêneros. Vai entender o que se passa na cabeça destas mulheres que votaram contra, projeto tão importante? Se bem que não é difícil se saber quem são estas traidoras da causa feminina.

Apesar de faltar ainda 11 dias para o início do Outono, as águas de março seguem derramando, aqui pelas bandas do Araguaia, a caminho do fechamento do verão. Sempre em tempo de lembrar-nos da eterna canção de Tom Jobim “Águas de Março”, belamente interpretada na voz de Elis Regina: “São as águas de março fechando o verão. É a promessa de vida no teu coração”. Entremeados de calor e noites mais frescas, vamos ditando o ritmo das nossas vidas, fazendo o melhor que podemos ser, com vistas à construção do Reino que se resume numa vida onde a justiça e o amor sejam as nossas medidas. Quem ama tudo pode! Verão é tempo de abrir o nosso coração e sonhar, de que somos capazes de reinventar-nos por outro mundo possível.

Conversão é coisa séria! Nosso Deus não se deixa enganar por uma conversão que seja superficial e passageira; o que Ele quer é uma mudança radical (Metanoia – mudança, transformação de caráter, na maneira de pensar, agir e fazer), que se expresse numa prática de vida, e não em simples ato de culto. Foi assim no Antigo Testamento e é assim também no tempo de Jesus. Pelo menos, é assim que a liturgia nos possibilita refletir com o texto do profeta Oséias (1ª Leitura), que assim se manifesta: “Quero amor, e não sacrifícios, conhecimento de Deus, mais do que holocaustos”. (Os 6,6) Assim profetizava Oseias no VIII a.C. Este pensamento vai ser retomado por Jesus, quando vemos sair de sua boca, através do evangelista Mateus: “Misericórdia é que eu quero, e não sacrifício” (Mt 9,13) Não é o sacrifício que conta, mas o muito amar!

Mas o Evangelho que a liturgia deste sábado nos traz é o da Comunidade Lucana (Lc 18,9-14) Jesus contando mais uma de suas parábolas, com o objetivo de traduzir numa linguagem mais simples e acessível, para que todos pudessem entender a sua mensagem. Mensagem esta que focava na questão primordial da busca pela humildade. De um lado um arrogante fariseu, que se achava o maior e mais privilegiado de todos os seres da face da terra; de outro, um simples cobrador de impostos, colocando-se no seu lugar e reconhecendo o seu ser frágil, diante da fortaleza que é Deus em pessoa, com o seu amor, sua misericórdia e predileção aos pequenos e marginalizados. Nosso bispo Pedro tinha uma forma muito concreta de viver nesta perspectiva quando assim afirmava: “Ser o que se é, falar o que se crê, crer no que se prega, viver o que se proclama até as ultimas consequências”.

“Quem se eleva será humilhado, e quem se humilha será elevado”. (Lc 18,14) Esta é a síntese da mensagem de Jesus para nós neste dia de hoje. Quem se acha o tal, se torna um ser insignificante e desprezível diante de Deus. Quem busca caminhar com as suas fragilidades, reconhecendo as suas limitações e fraquezas, este tem crédito imensurável diante de Deus. De onde não se espera nada, é que vem a grande descoberta. Ao longo da minha humilde caminhada, aqui no mato, fui descobrindo que, quanto mais distantes de Deus nós estivermos, menos pecadores nos sentimos. O contrario também é verdadeiro, quanto mais próximos de Deus nos acharmos, mais pecadores e limitados nos vemos, pois a sua grandeza infinda, elucida a nossa pequenez e nos faz vencedores com Ele. É na pequenez que buscamos, que nos tornamos fortalecidos, como nos aconselha a Santa Madre Teresa de Calcutá: “Seja fiel nas pequenas coisas porque é nelas que mora a sua força”.