Quarto Domingo do Tempo Comum. Estamos chegando ao final do mês de janeiro. Continuamos refletindo com a temática proposta do Ano Litúrgico B, sendo que o Evangelho de Marcos é o sugerido para todo este ano, com exceção dos tempos especiais da liturgia. Neste domingo iremos fazer literalmente a continuação do Evangelho do domingo passado, inclusive na sequência dos versículos anteriores, com a realização de um dos primeiros sinais (milagres) dos sete realizados por Jesus, e que Marcos nos traz em seu evangelho.

Oficialmente, a estação do ano é o verão, mas por aqui, como os “antigos” dizem, estamos no inverno. Isto porque está chovendo há quatro dias, felizmente! Parece que a nossa Amazônia, está sendo contemplada com as chuvas típicas deste período do ano. O Araguaia já deu uma boa recuperada, vindo encostar-se à barranca do rio. Os mais saudosos como eu, aproveitamos para contemplar os seus banzeiros, que são as sucessivas ondas provocadas pelas embarcações (voadeiras) dos indígenas em deslocamento pelo rio. Araguaia, meu Araguaia! A imaginação voa veloz como araras rumo ao horizonte. Teus encantos estão guardados nas esquinas de meu pensamento.

Rezei nesta manhã no silêncio da Comunidade Santo Agostinho, enquanto aguardava as pessoas para iniciar a celebração dominical. Comunidade da periferia de São Félix, constituída, em sua maioria, de trabalhadores. Gente simples e pobre. A realidade desta comunidade me fez rezar e refletir acerca do trabalho, sobretudo do trabalho escravo, já que hoje é o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo. Uma situação degradante, já que mais de 1 milhão de pessoas vivem em situação de escravidão contemporânea no Brasil. Dados mostram que cerca de 49,6 milhões de pessoas vivem em estado de escravidão contemporânea no mundo, das quais 1,05 milhão estão no Brasil. Ou seja, esta cifra mostra que no Brasil, há 5 escravizados a cada mil habitantes.

Na homilia, procurei refletir com a comunidade sobre o inicio da atividade messiânica de Jesus. Ele que está em Cafarnaum num dia de sábado na sinagoga. Cafarnaum que está localizada na margem norte do Mar da Galileia e foi o centro do ministério de Jesus na Galileia (Mt 9,1-2; Mc 2,1-5). Ela que ficou marcada pelos feitos de Jesus. Nesta cidade Ele começou a exercer o seu ministério, ensinando e realizando sinais (milagres). Como todo judeu, era hábito também de Jesus, aos sábados ir a uma sinagoga. Foi num dia como este, que Marcos registrou o começo da sua atividade pública de Jesus, sendo admirado pelo povo, por causa de seus ensinamentos, feitos com autonomia, sabedoria e autoridade.

Autoridade decorrente de sua condição divina, pois Ele era ao mesmo tempo Deus e homem. Jesus assumiu a natureza humana sem deixar de ser Deus: é verdadeiro Deus e verdadeiro homem. Autoridade, sabedoria e dignidade, pois não somente anunciava o Reino, mas realizava ações que comprovavam a presença deste Reino já acontecendo na realidade histórica. Como no texto de hoje, em que Ele resgata a dignidade de um pobre homem, “possuído por um espírito mau”. Jesus olha para ele, sente a sua dor e age com extrema compaixão e misericórdia para com aquele pobre homem.

Naquela época, a ação demoníaca escravizava e alienava as pessoas, impedindo-as de pensar e de agir por si mesmas. Com amorosidade, Jesus resgata a dignidade daquela pessoa e permite que ela seja autônoma e possa agir por conta própria. Este é o primeiro sinal (milagre) realizado por Jesus, fazendo com que aquele homem voltasse à consciência e à liberdade para a qual Deus o criou. Um fato curioso nesta cena é o reconhecimento de Jesus feito pelo espirito que tomava conta daquele homem: “Que queres de nós, Jesus Nazareno? Vieste para nos destruir? Eu sei quem tu és: tu és o Santo de Deus” (Mc 1,24) O mau reconhecendo o bem.

Jesus ensinando, anunciando e realizando os sinais com autoridade, pois toda a ação d’Ele repousa sobre uma prática concreta de libertação. Deus é Salvação e Libertação! É Palavra, mas é também ação! Em sintonia com a Palavra de Deus, o Ser superior de Jesus se sobrepõe à autoridade dos doutores da Lei. Os espíritos maus reconhecem Jesus e sua origem divina, menos os mestres da Lei, que querem ofuscar o messianismo de Jesus, arranjando um jeito de mata-lo. O texto de hoje nos ajuda a compreender a nossa missão como seguidores deste mesmo Jesus. Não é estando dentro das igrejas, cumprindo preceitos, normas e dogmas que nos qualificam como seguidores de Jesus de Nazaré. Muitos que estão fora dela são ateus, ou não professam a fé cristã/católica, e são mais verdadeiros que aqueles que não saem de dentro das Igrejas. Neste sentido, os “espíritos maus”, são mais verdadeiros que muitos de nós, pois eles reconheceram quem Jesus, de fato é.