Quinta feira da Terceira Semana da Quaresma. Estamos percorrendo o 23º passo de nossa conversão neste tempo litúrgico da Quaresma. 07 de março é o 67º dia do ano no calendário gregoriano. Faltam exatos 299 dias para acabar este ano bissexto. O tempo urge que nos deixemos moldar pela Palavra de Deus, através de uma mudança radical de vida. Nossa “Metanoia” deve nos atingir por inteiro, para que assim possamos estar em sintonia com o Projeto de Deus, revelado em e por Jesus de Nazaré. Ele que o evangelista São João definiu com estas palavras: “E o Verbo se fez carne e habitou entre nós”. (Jo 1,14) O Filho de Deus já existia em Deus, voltado para o Pai: estava em Deus, como a Expressão de Deus, eterna e invisível. O Filho é a Imagem do Pai, e o Pai se vê totalmente no Filho, ambos num eterno diálogo de mútua comunicação.

Nesta data de hoje que antecede o Dia Internacional das Mulheres, estamos todos de luto. Comemoramos hoje o Dia de Luto Nacional pelas Vítimas de Violência Doméstica. Esta data foi instituída pelo Decreto nº 8/2019. Lembrando que a Violência Doméstica é caracterizada por uma realidade social intolerável e inadmissível, onde milhares de mulheres perdem a vida. Segundo dados de 2023, o Brasil registrou 722 feminicídios. O maior número registrado desde 2019. Esta estatística representa um aumento de 2,6% em comparação com os 704 casos contabilizados no mesmo período de 2022, segundo levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Violência Doméstica é crime! Denunciar esta violência é uma responsabilidade de todos! O Luto é luta para quem se indigna!

Apesar do dia de hoje representar um retrocesso de nossa humanidade desumanizada, acordei nesta manhã inspirado. Talvez pelos sonhos de uma noite bem dormida. Fui invadido pelo pensamento de um dos maiores teólogos de todos os tempos: Karl Rahner (1904-1984). Rahner foi um sacerdote jesuíta alemão e um dos teólogos mais influentes do século XX. Estudou a espiritualidade da Ordem dos Jesuítas e de seu fundador Santo Inácio de Loyola, superando os estreitamentos ecumênicos, chamando a atenção da teologia católica para a problemática dos outros caminhos religiosos. Foi ele um dos principais e mais importantes teólogos para o Concílio Vaticano II (1962-1965), convidado que fora pelo Papa João XXIII, recebe o reconhecimento e o agradecimento especial do Papa Paulo VI.

Baseado neste grande teólogo que influenciou por demais o meu pensamento de quando era estudante do Instituto Teológico São Paulo – ITESP (1985-1988), atrevi-me a escrever sobre a temática do Concílio para se chegar à perspectiva de uma “Igreja em Saída”, como propõe o nosso Papa Francisco. É bom que saibamos que o Concílio, foi a grande sacada da Igreja quando, a partir deste importante momento histórico, a Igreja sai de si mesma e de seus meandros, e abraça a modernidade, encontrando respostas factíveis para a problemática da humanidade, tendo como fonte inspiradora o Projeto Messiânico de Jesus de Nazaré. Aos que desejarem, sugiro a leitura de um de seus livros: “Curso Fundamental da Fé” – Karl Rahner, Ano 1989

O Concílio Vaticano II nos fez ser Igreja dentro da modernidade. Sacudiu o mofo de suas entranhas e abriu as janelas para que o vento da modernidade oxigenasse o seu interior, suas entranhas. Até a língua vernácula ganhou vez e voz. A primeira perspectiva de uma “Igreja em Saída” estava sendo ensaiada ali, naquele contexto histórico. Uma Igreja que queria estar no mundo, enfrentando a sua problemática e dando passos concretos em meio à realidade do povo de Deus. Igreja povo de Deus em marcha, caminhando com os filhos de Deus, mesmo a contragosto daqueles que, ainda hoje, não aceitam as proposições do Concílio, talvez agarrados aos seus privilégios, comodismos e uma necessidade doentia de preservação do ego inflado. Muitos dos que hoje contestam e criticam o Concílio Vaticano II sequer leram alguns de seus documentos tais como: Dei Verbum, Lúmen Gentium, Gaudium et Spes, para ficar nestes. Como já nos dizia Karl Rahner: “A causa número um do ateísmo são os cristãos. Aqueles que o proclamam com a boca e negam-o com suas ações é o que um mundo incrédulo encontra inacreditável.”

“Igreja em saída” foi o termo cunhado pelo papa Francisco na exortação apostólica Evangelii Gaudium, a alegria do evangelho (EG). Na compreensão do papa, uma “Igreja em saída” é aquela que é decididamente missionária, capaz de sair da sua auto referência, objetivando chegar a todos e todas, indistintamente, a fim de testemunhar no mundo o amor misericordioso salvífico de Deus. Ele é amor e quer salvar a todos. Uma Igreja que aceita o desafio e toma a iniciativa, sem medo de ir ao encontro dos afastados, das periferias existenciais e geográficas, de chegar às encruzilhadas dos caminhos para convidar os excluídos (cf. EG 24). De uma Igreja centrada em si mesma para a uma Igreja aberta à alteridade (individualidade e especificidade do outro), porque “quem deseja viver com dignidade e em plenitude não tem outro caminho senão reconhecer o outro e buscar o seu bem” (EG 9). O Concílio Vaticano II e a Igreja em Saída são duas realidades que se encontram numa mesma perspectiva de uma Igreja que quer ser de Jesus no mundo, como foram as primeiras comunidades cristãs.