Sexto Domingo do Tempo Comum. Um domingo que inicia a semana nos colocando dentro da festa mais popular do povo brasileiro. É carnaval! Tempo de folia e festa em todos os quadrantes do solo nacional. Todavia, no horizonte das comunidades cristãs, vem aproximando a “Quarta Feira de Cinzas”, início da Quaresma. Com ela, já estamos pensando na Campanha da Fraternidade, que neste ano nos traz o tema: “fraternidade e Amizade Social” e o lema: “Vós sois todos irmãos e irmãs” (Mt. 23, 8). Lembrando que o expressivo cartaz deste ano e a oração da Campanha da Fraternidade 2024, foram inspirados na Encíclica Fratelli Tutti (Todos irmãos) do Papa Francisco. A fraternidade e a amizade social para construir um mundo melhor, pacífico e com mais justiça.

Nem parece que amanhecemos num domingo de carnaval. O sol não deu as caras. Enormes nuvens o esconderam nesta manhã. O friozinho substituiu o intenso calor, típico desta época do ano por aqui. Depois de iniciar a minha oração matinal, degustando uma quente cuia de chimarrão em meu quintal, na presença das testemunhas da natureza, conclui-a no silêncio martirial da Catedral de São Félix do Araguaia, escalado que estava para presidir a celebração com a comunidade. Celebrar naquele espaço religioso é um privilégio de poucos. É muita energia concentrada num único espaço. Diante das fotos de Pedro, Tia Irene, Veva e Ezequiel Ramim, pedi licença para também ser merecedor de tão grande graça, por estar presente ali e celebrar.

Não posso negar que Deus sempre foi muito generoso para comigo. Depois de deixar para trás todo um estilo de vida religiosa, focada na evangelização dos grandes centros urbanos, e vir morar e trabalhar com Pedro nesta Prelazia, foi esta a minha grande descoberta. Migrei de corpo e alma para a periferia da periferia. Ao encontrar a realidade dos povos indígenas, conviver e aprender deles e com eles, não consegui mais voltar atrás. O meio urbano já não faz mais parte da minha vida. Sou um cidadão do mato, com muito orgulho do indigenismo que apossou de minha alma, fazendo de mim um com eles e para eles nas causas deles, inspirado no profeta do Araguaia.

Domingo é o Dia do Senhor! Dia de celebrar a presença indissociável de Deus no meio de nós. Um domingo em que a liturgia nos brinda com textos maravilhosos e que nos ajudam a situar dentro da temática da Campanha da Fraternidade 2024: Fraternidade e Amizade Social. Seguimos na sequência dos domingos anteriores do Evangelho de Marcos, concluindo hoje o capítulo primeiro. Lembrando mais uma vez que todo o Evangelho de Marcos é o começo da Boa Notícia do Reino que Deus dirige às pessoas. Ela continua, em todos os tempos e lugares através daqueles e daquelas que fazem o propósito de seguirem os mesmos passos de Jesus de Nazaré.

“Um grande profeta surgiu, surgiu e entre nós se mostrou; é Deus que seu povo visita, seu povo, meu Deus visitou!” (Lc 7,16) Marcos nos situa Jesus desenvolvendo a sua atividade messiânica na Galileia, sendo procurado por um leproso, desejoso de ser curado por Jesus. Pelo fato de ser impuro (doente), este homem era uma pessoa excluída do convívio social, politico e religioso da época. Naquele tempo, as doenças eram associadas ao pecado que as pessoas ou o seus haviam cometido. Ninguém os podia tocar, muito menos eles tocarem quem quer que seja. Tais pessoas eram triplamente descartadas: por serem doentes, pecadoras e impuras. A reação de Jesus é de indignação, seja com o poder político e também com as autoridades religiosas, que realçavam ainda mais o preconceito para com aquelas pessoas, afastando-as do convívio religioso.

Jesus se aproxima e toca literalmente aquela pessoa. O sentimento d’Ele é de amor, compaixão, ternura, misericórdia… Ele rompe a estrutura de distanciamento para com aquelas pessoas, a toca, fazendo com que fique curada: “cheio de compaixão, estendeu a mão, tocou nele e disse: “Eu quero: fica curado!”. (Mc 1,41) Jesus fica indignado com aquela sociedade que produz a marginalização. Por isso, conforme a prescrição da Lei, o homem curado deve apresentar-se para dar testemunho contra um sistema que não cura, mas só declara quem pode ou não participar da vida social. Dali em diante, o pobre homem adere a propaganda acerca de Jesus, tornando-se testemunha viva, que anuncia Jesus, aquele que purifica e dá vida. É no lugar onde estão os marginalizados que se pode encontrar com este Jesus.

A impureza começa no coração. “O que sai do homem, isso é que o torna impuro. Pois é de dentro do coração humano que saem as más intenções” (Mc 7, 20-21). Todos nós precisamos passar por um processo de purificação, permitindo que o nosso coração seja a fonte principal de todas as nossas ações. Como Jesus, deixarmos ser invadidos pelo sentimento de compaixão, sobretudo com os marginalizados. Como nos alerta o Papa Francisco: “Não é o exterior que salva. Roupas, crucifixos, véus, etc. E sim a bondade do coração, o amor”. Movidos pelo sentimento da compaixão, possamos seguir o conselho paulino: “Sede meus imitadores (seguidores) como eu sou de Cristo”. (1Cor 11,1) Ele quer! Eu quero! E você?