Segunda feira da segunda semana do Advento.

Francisco (Chico) Machado. Missionário e escritor.

Tempo de expectativa do esperar fazendo acontecer no esperançamento. A semana começando e nós recomeçando a nossa caminhada rumo ao horizonte das utopias do Reino. Preparando o chão da nossa casa para acolher o Salvador que virá na simbologia do Natal. O Deus que é tudo em todos é presença viva em nós, através do Filho que se fez um conosco: “Deus Pai nos arrancou do poder das trevas e nos transferiu para o Reino do seu Filho amado, (Col 1,13) Sigamos firmes na nossa fé no Deus vivo e verdadeiro.

Meu dia começou no compasso do vento anunciando a chuva. Nuvens carregadas prenunciando uma manhã chuvosa. A madrugada se dissipando cedendo lugar ao clarão do dia. Gosto de apreciar o amanhecer. Ele me traz a presença de Deus mais próxima de mim. Entrego-me à oração confiante de que Deus está ali a me ouvir. Sacrificar algumas horas de sono faz sentido, quando se tem um objetivo claro. Aprendi com o nosso bispo Pedro que, quando em casa, era encontrado na capela antes do dia raiar. Silenciosamente ali diante do sacrário. Pedro, um místico revolucionário das causas do Reino. Daí entender de onde vinha tanta energia.

Aprender e ensinar como Jesus. Esta é a conotação de que o Mestre Galileu nos é apresentado pelo texto da liturgia desta segunda feira. Segundo o evangelista Lucas, Jesus está ensinando mais uma vez. Desta vez, não apenas para os seus discípulos, mas para as lideranças que se reuniam em torno de si: “À sua volta estavam sentados fariseus e doutores da Lei, vindos de todas as aldeias da Galileia, da Judeia e de Jerusalém”. (Lc 5,17) Jesus que ensina, mas também pratica aquilo que ensina, unindo teoria e prática, saber que se transforma em ação cidadã, devolvendo a dignidade daqueles que eram excluídos e marginalizados.

No tempo de Jesus, a doença era causada pelo pecado. Segundo esta concepção, o doente era tido como um amaldiçoado por Deus. Estas mesmas lideranças que estão escutando Jesus não atribuíam à doença as mazelas sociais da desigualdade pelas quais os empobrecidos passavam. Os pobres eram excluídos e marginalizados também por causa das doenças que os acometia. Diante deste contexto, tais lideranças ficam possessas com Jesus, ao lhe trazerem um homem paralitico para ser curado por Ele.

Jesus não somente perdoa o pecado daquele pobre homem, como o cura da sua paralisia, devolvendo-lhe a dignidade para voltar ao convício social. Ou seja, para libertar o homem, Jesus vai direto à raiz da questão: o pecado invisível que causa os males externos e visíveis. As autoridades judaicas ficam chocadas com Jesus pelo fato dele perdoar os pecados, que na concepção deles, somente Deus tinha tal prerrogativa. E Jesus vai além quando diz: “Para que saibais que o Filho do homem tem na terra poder de perdoar pecados — disse ao paralítico — eu te digo: levanta-te, pega o leito e vai para casa”. (Lc 5, 24) A ação de Jesus é inteira. Promove a cura por dentro e por fora, fazendo o homem reconquistar a sua capacidade de caminhar por si mesmo.

A expressão “Filho do Homem” aparece pelo menos umas 187 vezes nas Sagradas Escrituras. Em uma de suas visões, o profeta Daniel assim expressa: “Em imagens noturnas, tive esta visão: entre as nuvens do céu vinha alguém como um filho de homem”. (Dn 7,13) Evidentemente que quando Jesus usa tal expressão, ele está se referindo a si mesmo. Esta é a identidade de Jesus. Embora não sendo reconhecido pelas autoridades religiosas de seu tempo, Jesus é o Filho de Deus. O Verbo encarnado, Palavra que se faz vida. Conhecer a Jesus é conhecer o Pai. Ele nos revela o Pai, como o evangelista São João assim nos diz: “Se vocês me conhecem, conhecerão também o meu Pai. Desde agora vocês o conhecem e já o viram.” (Jo 14,7)

A liturgia de hoje quer que reflitamos sobre a nossa concepção de pecado, mudando também a nossa relação com Deus e com os outros. O pecado faz parte da nossa realidade humana. Ele está intrínseco a nossa natureza de seres mortais. Todavia não é a realidade última, pois temos a chance de nos redimir, buscando a erradicação deste das nossas vidas. Isso se faz pelo processo de conversão que se dá a cada dia. Conversão que se dá num processo permanente de mudança. Como diria dom Hélder Câmara: “Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo.” O primeiro passo a ser dado é não rejeitar o Projeto de Deus revelado por Jesus, como as autoridades religiosas do tempo de Jesus e algumas ainda hoje entre nós. Para estes, Jesus vai dizer: “Não adianta nada eles me prestarem culto, porque ensinam preceitos humanos.” (Mt 15,9)