Sexta feira da Segunda Semana da Páscoa. O mês de maio vem chegando devagarinho, sextando com ponto facultativo, depois de um feriado, num clima bem afeito aos que são devotos da farra. Até São Pedro entrou no clima por aqui, afugentando o forte calor, deixando em seu lugar uma temperatura mais amena, com o Sol se escondendo por entre nuvens. Como cristãos, porém, não devemos nos esquecer de que seguimos dentro do contexto da Páscoa. Significa que o Ressuscitado está muito vivo no meio de nós, e quer que sejamos os defensores maiores da vida com dignidade de filhos e filhas de Deus para todos e para todas. A vida é o maior dom que o Criador nos concedeu como dádiva de seu amor infinitamente misericordioso.
Como a vida de uma pessoa muito importante que celebramos neste dia 2 de maio. Foi nesta data que, em 2014, vimos acontecer a Páscoa de Dom Tomás Balduino (1922-2014), bispo emérito da cidade de Goiás. Bispo dos bons, assessor da Comissão Pastoral da Terra (CPT), que teve um destaque enorme nas questões que envolvem à Reforma Agrária e aos direitos dos povos indígenas, já que também atuou no Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Sobre ele, dizia o nosso bispo Pedro: “Dom Tomás e sua Igreja de Goiás têm sido uma resposta a muitas inquietudes e esperanças, uma constatação de que ‘outra Igreja é possível’. O Vaticano II, Medellín, a Igreja dos Pobres, a Igreja da Libertação, a Igreja das CEBs, uma Igreja inculturada e comprometida com a Nossa América, são história vivida nesse recanto do Goiás, a Diocese de Goiás”.
Maio segue ainda no clima das festividades do Dia dos trabalhadores e trabalhadoras. Neste país das desigualdades sociais, a classe trabalhadora vive um dia de cada vez, lutando na defesa de seus direitos, sistematicamente violentados e desrespeitados, por uma elite que insiste em viver no paraíso do lucro, da ganância, fruto desta terrível desigualdade. Os trabalhadores e trabalhadoras são aqueles que constroem com o suor e seu sangue este país, mesmo sem serem reconhecidos na sua dignidade de filhos desta terra. Bem que, a seu tempo, o sociólogo alemão Karl Marx (1818-1883) já denunciava: “Os ricos não geram riqueza. Os ricos ficam com a riqueza. Por isso são ricos. Se gerassem riqueza se chamariam trabalhadores”.
Riqueza maior que podemos ver na atuação de Jesus durante o seu ministério messiânico, vivendo e convivendo com a ralé, os mais pobres e abandonados pela religião e pela sociedade de sua época. Continuamos com a nossa reflexão do texto do Evangelho de João, que a liturgia nos reservou para esta sexta feira. Estamos iniciando hoje a leitura orante do capitulo 6 deste evangelista, que ao longo dos seus 71 versículos, descreve para nós o Discurso Eucarístico de Jesus sobre o Pão da Vida. Pão da vida que é Jesus em pessoa. Hoje vamos refletir mais diretamente sobre o quarto sinal (milagre) realizado por Jesus, entre os seus com a partilha dos pães, que alguns dentre nós, insistem em dizer se tratar da “multiplicação dos Pães”.
Como já sabemos, o Evangelho de João é diferenciado dos demais Evangelhos Sinóticos. O corpo de seu evangelho é constituído por um prólogo (1,1-18), um epílogo (21) e duas grandes partes, conhecidas pelos exegetas como o Livro dos Sinais (1,19-12,50) e o Livro da Glória (13,1-20.31). Os sete sinais estão assim distribuídos ao longo do texto joanino: Cura do filho do oficial real (Jo 4,46-54); Cura do paralítico no tanque de Betesda (Jo 5,1-15); Alimentação dos cinco mil (Jo 6,1-15); Caminhar sobre a água (Jo 6,16-21); Cura do cego de nascença (Jo 9,1-41); Ressurreição de Lázaro (Jo 11,1-44). Hoje vamos aprofundar um pouco mais acerca do quarto sinal, para que assim possamos conhecer um pouco mais da proposta de Jesus, ao criar uma nova sociedade, onde a partilha seja a espinha dorsal nas relações entre as pessoas.
A mesa Eucarística é a mesa da partilha. É o lugar de encontro com Deus e com os irmãos e irmãs. Pão partilhado, vida partilhada! O Pão não é meu, nem seu; o Pão é Nosso, porque o Pai é Nosso. A Partilha do Pão Eucarístico, que é Jesus, se faz na partilha do da vida, dos dons e serviços pelas causas do Reino, representadas na vida dos pobres e descartados. Mais do que um Sacramento, devocional, é Jesus mesmo que se faz partilha da sua vida, como dom total de Deus. Neste sinal da partilha, Jesus revela a sua identidade messiânica. Ao narrar com tanta propriedade este sinal realizado por Jesus, João nos mostra a missão cristológica de todos nós: ser partilha que se dá na gratuidade.
Todos comeram e ficaram saciados, inclusive, mulheres e crianças que não eram contados: “Quando todos ficaram satisfeitos, Jesus disse aos discípulos: Recolhei os pedaços que sobraram, para que nada se perca!” (Jo 6,12) Está é a missão que Jesus propõe viver como proposta de fé encarnada: ser sinal do amor generoso de Deus, assegurando a todos e todas, a possibilidade de subsistência e dignidade. O segredo da vida partilhada não está no muito que poucos possuem e retêm para si, mas no pouco de cada um que é repartido entre todos e todas. A garantia da dignidade não se encontra no poder de um poderoso que manda, mas no serviço de cada um que organiza a vida em sociedade para o bem de todos e todas. Pão partilhado, vida partilhada! Pão repartido, vida repartida! Isto é Eucaristia. Tal sacramento fora deste contexto é um mero pretexto de um devocionismo fundamentalista desencarnado.
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