
“O medo cega (…), são palavras certas, já éramos cegos no momento em que cegamos, o medo nos cegou, o medo nos fará continuar cegos”(…) “Se podes ver, repara”
(José Saramago, em Ensaios sobre a Cegueira)
No Evangelho de Marcos (8:22-26), onde Jesus cura um cego de forma gradual que, inicialmente vê pessoas como árvores andando…, parecendo ter pés e braços a se movimentarem no rastro de luz que seus olhos em cura projetavam na escuridão. Dando asas à imaginação amorosa do que acontecia, na proximidade de Jesus, tudo nos fez aceitar quando dissera: “Eu sou a Luz do mundo, quem me segue não andará nas trevas”.
No Evangelho de João 9,40, no debate sobre a cura do cego de nascença, Jesus questionou a cegueira dos fariseus: “Alguns fariseus que estavam perto dele ouviram isso e disseram: ‘Será que também somos cegos?’”. Trata-se de não conseguirmos ver o mundo a partir da fé, por mais religiosos que possamos parecer.
“Graças à misericordiosa compaixão do nosso Deus, o sol que nasce do alto nos visitará, para iluminar os que jazem nas trevas e nas sombras da morte, e dirigir nossos passos nos caminhos da Paz” ( Lc.1,67-79)

Essa luminosa presença é o Sol da Justiça, que faz toda a Criação movimentar-se revelando com paciência de que tudo clama e se movimenta na história a caminho da plenitude dos tempos. Contaremos com o toque final da mão do Pai sobre o que faltou de nossa ação na construção do seu Reino, aquela parte que não demos conta.
Meu amigo filósofo, Alcimar de Oliveira, um dos apreciadores dos meus escritos, fez o seguinte comentário acerca do texto “AS FLORES DE MAIO EM TEMPOS DA VIDA, DA INFÂNCIA À VELHICE COM AMOR, CUIDADO – SEMEANDO E COLHENDO”
“Que belo texto, caro amigo, a dar voz à natureza e afirmar a força educativa das árvores, dos jardins, das flores, plantas, sementes. Veio-me à memória o episódio da cura do cego de Betsaida, que, ao recuperar a visão, via inicialmente as pessoas como se fossem árvores andantes”.
Assim sendo, faço uma incursão dentro do pensamento de Jesus e do cego a ser curado da epidemia da indiferença e do descaso do sistema por todos aqueles que o tinham marginalizado. Em busca do clarão da justiça estão todos nós, testemunhando aqueles que sofrem o genocídio na faixa de Gaza e da fome que mata, mesmo antes de nascer, de envelhecer apressadamente e de morrer sem dignidade.
No tempo de Jesus histórico, nos caminhos da Galileia como nos tempos de nossa vida, constatamos a existência de cegueira social, muitas vezes provocadas pela religião, pelo fundamentalismo e seus tons. Se o Evangelho de Jesus fosse a transparência do olhar e do escutar das dores dos descartados, seriam vistas “árvores” humanizadas, abrindo os galhos como mãos a celebrar todos os direitos humanos.

Por outro lado, as trevas que caem sobre o mundo são densamente apavorantes porque negam as relações de fraternidade e obscurecem até a chegada da luz. No cenário mundial, com o avanço dos impérios em disputa, evidenciamos os dois tipos de cegueiras: física e a moral. Saramago dá o nome de “cegueira branca” para representar o egoísmo, a posse de tudo e o poder ilimitado, mas também o medo, a covardia, a raiva, as intolerâncias, os preconceitos e demais sentimentos que cegam o ser humano e o levam à indiferença ou à perdição.
Em tempos de Igreja em Saída, do retorno das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), da multiplicação dos ministérios, do fim do clericalismo, haveremos de crer que a utopia de uma Nova Terra e um Novo Céu ainda é possível com a presença do Espírito Santo de Deus, que enche a face da terra de LUZ HUMANA E DIVINA.
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