Terça feira da Décima Primeira Semana do Tempo Comum. Entramos já para as últimas duas semanas do mês das festas juninas. Ainda falta celebrarmos São João e São Pedro/Paulo. Enquanto isso, o Nordeste em festa, segue nos dando uma aula de como comemorar com alegria descontraída estes santos tão importantes de nossa devoção popular e que fazem parte de nosso Calendário Litúrgico anual. Aqui para nós do Araguaia, um amanhecer de temperatura mais amena, diferentemente de outras partes deste nosso imenso país. Dá até para jogar-nos no rio no período da tarde, oportunizando-nos uma boa refrescada, mergulhando nas águas do rio.
Por falar em refrescada, sai muito cedo de casa e fui rezar as margens do Araguaia. Aos poucos, lá do Tocantins, o Sol veio despontando do chão da Ilha do Bananal, desbravando o dia, me fazendo lembrar o verso de um dos poemas de nosso bispo Pedro, que ele retrata este cenário: “Eu, Araguaia e tu, um tempo só. Abraamicamente numerosas, nos garantem o sonho proibido as estrelas, lá fora canceladas”. (EU, ARAGUAIA E TU – Pedro Casaldáliga) Contemplei a ternura de Deus, presenteando-nos com um novo dia, dando-nos a oportunidade de recomeçar e fazer o novo diferente: “Se alguém está em Cristo, é nova criatura. As coisas antigas já passaram; eis que surgiram coisas novas!” 2 Cor 5,17) Ser esta nova criatura é, guiados pelo Espirito, anunciar e testemunhar o Evangelho.
Em tempo de Ecologia Integral e da necessidade de buscarmos a nossa conversão ao Cuidado da Casa Comum, lembramos que no dia de hoje se comemora o “Dia Mundial de Combate à Desertificação e à Seca”. O objetivo primeiro desta data é levarmos adiante a missão de sensibilizar a população mundial sobre o processo avançado de desertificação e os efeitos negativos que a seca pode provocar a nível regional e mundial. No Brasil, calcula-se que uma área de 230 mil km², na região Nordeste, já esteja em processo de desertificação. Significa que esta desertificação consiste na perda da capacidade de determinado ecossistema de renovar os seus recursos biológicos, seja por culpa da ação humana ou das variações climáticas. É de todos sabido, que a água é essencial para a vida, e nos locais onde há escassez deste recurso natural são esperados danos catastróficos para a existência de todos os seres vivos.
O Brasil possui ao todo 5.565 municípios, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Estima-se que aproximadamente 35 milhões de brasileiros não tem acesso à água tratada, potável, nem sequer para lavar as mãos. Enquanto isso, 40,1% da água é perdida antes mesmo de chegar à casa das pessoas. Inadmissível uma realidade desta, sobretudo porque o maior aquífero do mundo fica no Brasil e abasteceria o planeta por 250 anos. Essa reserva existe e está localizada na parte brasileira da Amazônia, sendo praticamente subutilizada. Todo o processo de danificação do meio ambiente contribui significativamente para o processo de desertificação, comprometendo assim a nossa vida no Planeta.
A nossa missão de evangelizar supõe também esta sintonia com o Planeta. Entretanto, o desafio proposto por Jesus no texto da liturgia de hoje é por demais “dificultoso”, como dizem por aqui os mais antigos: “Amai os vossos inimigos e rezai por aqueles que vos perseguem!” (Mt 5,44) Como amar o inimigo, sabendo que ele é o nosso inimigo? Como amar aquele que nos perseguem com mentiras, ódio, maldades, desfaçatez, injúrias? Difícil tarefa! Incumbência nada fácil que Jesus pede aos que desejam seguir os seus passos, na missão de serem testemunhas vivas do Ressuscitado. Como amar o inimigo sem fazer uso da sua força desproporcional de maldição?
Amar o inimigo não significa concordar com tudo o que ele faz e nem com os seus métodos de desamor. Assumir esta dimensão do amor proposto por Jesus é nos opormos a todas as formas de opressão defendidas e assumidas pelo inimigo. Como dizia nosso pedagogo maior Paulo Freire, em seu livro “Pedagogia do Oprimido: amar o opressor é fazer com que ele deixe de ser opressor, pois ele “só se solidariza com os oprimidos quando o seu gesto deixa de ser um gesto piegas e sentimental, de caráter individual, e passa a ser um ato de amor”. Amar o inimigo é ser mais forte que ele e não deixar ser contaminado pelo seu veneno mortal. Como nos lembrou sabiamente Martin Luther King: “No final, não nos lembraremos das palavras dos nossos inimigos, mas do silêncio dos nossos amigos”.
Este texto de Mateus, que nos traz as palavras desafiadoras de Jesus nos mostra que o relacionamento humano está muito mais além das fronteiras estabelecidas pela humanidade. Amar o inimigo é entrar em relação direta e concreta com aquele que também é amado por Deus, mas que se apresenta como problema para todos nós. Amar em meio aos conflitos é muito mais desafiador, uma vez que os conflitos também são uma tarefa que cabe ao amor. Como seguidores e seguidoras de Jesus, somos desde já, convidados a um comportamento que nos tornem filhos e filhas, testemunhando a justiça do Pai. O romancista, dramaturgo e poeta francês Victor Hugo (1802-1885) entendeu de forma particular esta proposta de Jesus ao assim escrever: “Vós, que sofreis, porque amais, amai ainda mais. Morrer de amor é viver dele”. Amar desta forma é ser perfeito, assim como Deus é perfeição em nossa imperfeição.
Comentários