Décimo Nono Domingo do Tempo Comum. Como o mês de agosto é dedicado à oração pelas vocações, neste segundo domingo, trazemos presente a vocação matrimonial, celebrando o Dia dos Pais. Com o passar do tempo, a vida vai nos ensinando que ser pai não é dar ao filho aquilo que ele quer, mas o que este necessita para encontrar o próprio caminho com as suas próprias pernas. Neste sentido, exalto a pessoa de meu pai, que mesmo com o seu pouco estudo, constituiu uma família numerosa, e nos formou com os valores, forjando a nossa personalidade. Apesar de muitos filhos, nunca deixou faltar nada, sustentando-nos com o seu trabalho de ferroviário exemplar, de quem muito me orgulho. Seu Zé Altino, fez-me ser quem sou, com seu jeito mineiro de ser. Estava sempre de bem com a vida, irradiando alegria por onde passava.
222º dia do ano. Neste 2º domingo de agosto, temos também uma data triste para relembrar. Neste dia, trazemos viva a memória do Frade Dominicano, Frei Tito de Alencar (1945-1974). Pertencendo a Ordem dos Frades Dominicanos, este cearense de Fortaleza, engajou-se muito cedo, militando na Juventude Estudantil Católica (JEC), envolvido com movimentos de cultura e educação popular, além de ter sido vice-presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES). Foi duramente perseguido e torturado pelos algozes da ditadura militar, sendo detido pela segunda vez em 1969, juntamente com os jovens dominicanos Frei Betto, Frei Fernando, Frei Giorgio e Frei Ivo. Viveu os seus últimos dias na França, no Convento Saint Jacques e, não conseguindo conviver com a presença forte de seu torturador, cometeu o suicídio, em 10 de agosto de 1974. Um dos versos de seu poema resume o seu calvário: “Quando secar o rio de minha infância, secará toda dor”. Frei Tito, Mártire da Caminhada!
Marchei ainda muito cedo rumo ao túmulo do profeta, pai de todos nós aqui do Araguaia. Fui rezar e pedir a sua benção e intercessão, por todos aqueles que o tiveram como pastor desta Igreja e também por aqueles e aquelas que o tiveram como inspiração e mística para as lutas na caminhada. Em sintonia orante com Pai Pedro, senti a força que brota daquele chão sagrado, onde os restos mortais do pastor descansam em harmonia com a natureza, que também reverencia o pastor, depositando sobre o seu túmulo as flores do pequizeiro frondoso que lhe faz sombra. Conclui o meu momento orante relembrando e trazendo na memória um dos versículos de uma das cartas de Paulo: “Nos gloriamos nas tribulações, porque sabemos que a tribulação produz perseverança; a perseverança, um caráter aprovado; e o caráter aprovado, esperança”. (Rom 5,3-4) Esperança vivida em meio a uma luta perseverante, ancorada na certeza, garantida pela força do Espírito Santo.
“Vocação é diferente de talento. Pode-se ter vocação e não ter talento, isto é, pode-se ser chamado e não saber como ir”, observa uma de minhas escritoras favoritas, Clarisse Lispector (1920-1977). A vocação paterna está constituída na vida humana, como também está presente a vocação da mãe que também é pai. Pai e mãe ao mesmo tempo, seja pelas circunstâncias históricas, seja pelas vicissitudes, daqueles que não souberam ser pais de verdade e abandonaram os seus. Celebrando a vocação de nossos pais biológicos, relembramos que, ao longo da vida, vamos colecionando outros pais que passam a fazer parte de nosso roteiro histórico. No meu itinerário do ministério presbiteral, tive três pais importantes e significativos que foram forjando o meu ser sacerdotal: Dom Cláudio Hummes, Dom Angélico Sândalo Bernardino e Pedro. Cabendo a este último pai, traçar o meu perfil indigenista.
“Não tenhais medo, pequenino rebanho, pois foi do agrado do Pai dar a vós o Reino”. (Lc 12,32). É exatamente desta forma que Lucas inicia o seu texto de hoje, com uma das falas de Jesus, direcionada a seus discípulos. Celebrando o dia de nossos pais, vemos a atitude de Jesus se referindo a amorosidade do Pai misericordioso, que está sempre pronto a nos conceder o que há de melhor com o seu Reino. Jesus está lembrando aos discípulos, escolhidos e chamados (vocação) por Ele, para levar adiante o projeto do Reino de Deus, que precisa ser implantado na realidade humana. Assim, cada um deles e nós, que fazemos a nossa adesão, devemos estar a serviço do Reino. Não de qualquer forma, mas atentos e vigilantes, cumprindo a cada momento as tarefas que Deus nos pede, servindo o Reino com humildade e simplicidade.
“Onde está o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração”. (Lc 12,34) O serviço pelo Reino se faz na simplicidade, no desapego e na entrega confiante pelas causas da vida. Servir ao Reino, se faz através de um processo contínuo de redescoberta do nosso lugar e da nossa missão no projeto que Deus tem para nós e para o mundo. Estar a serviço do Reino supõe não cruzar os braços diante das dificuldades, com atitudes de comodismo e resignação, buscando apenas uma fé de aparência ou de orações desencarnadas. Deus precisa de cada um e cada uma de nós, e conta conosco na construção de um mundo mais justo, mais humano, mais fraterno e irmão. Enquanto a sociedade do consumo nos faz acreditar que a vida se resume na luta pela aquisição desenfreada de bens, tornando uma ansiedade contínua e pesada, somos desafiados a buscar o Reino, onde haja a promoção de relações de partilha e fraternidade. Como nos diz nosso Pai Pedro: “O Reino não é um lugar, é um jeito de ser. É festa, mas também é cruz”.
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