Sexta feira da Décima Segunda Semana do Tempo Comum. Junho sextando pela última vez, num dia em que a Liturgia da Igreja Católica celebra a Solenidade do Sagrado Coração de Jesus. Uma data móvel, que acontece sempre na segunda sexta-feira após Pentecostes. Esta Solenidade é uma festa central que nos convida a contemplar o amor infinito de Deus, revelado no Coração de seu Filho. Esse Coração, símbolo de toda a entrega, é ao mesmo tempo ferido pelo pecado da humanidade e aberto como fonte de salvação para todos nós. Celebrar o Sagrado Coração é celebrar a centralidade do amor que salva, que perdoa sempre antes mesmo de ser pedido, que não se cansa de recomeçar. Este Coração é humilde e manso, como Ele mesmo disse: “Aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração” (Mt 11,29). Pena que os sábios e inteligentes não são capazes de perceber a presença do Reino e sua justiça através de Jesus.
Como bem resumiu São Bernardo: “O mistério do coração abre-se através das feridas do corpo; abre-se o grande mistério da piedade, abrem-se as entranhas de misericórdia do nosso Deus.” O Coração de Jesus continua hoje, batendo pelos seus filhos: na Palavra proclamada, na Eucaristia celebrada, no compromisso com a transformação da realidade dos empobrecidos, através da dimensão social da fé que a Doutrina Social da Igreja (DSI), faz questão que seja também o nosso compromisso de fé engajada nas causas dos pequenos, pobres e marginalizados. Cabe a nós, como discípulos e discípulas seguidores/as de Jesus, nos deixarmos encontrar por esse Pastor que não desiste de ninguém, mesmo quando desistimos de nós mesmos.
Como alguns chegam a pensar não se trata apenas de uma solenidade devocional de adoração do Santíssimo, entre as paredes do templo, mas de deixar abrir o nosso coração para as mesmas causas de Jesus, indo ao encontro dos pobres das periferias geográficas e sociais. Entre nós há aqueles que se abrem devotamente ao Sagrado Coração de Jesus, mas não capazes e nem conseguem enxergar os corações partidos dos pobres nas encruzilhadas dos caminhos. Celebrar a Solenidade do Coração de Jesus é contemplar o amor de Deus e deixar-nos tocar por esse amor, sua bondade, ternura e misericórdia por toda a humanidade, sem exceção. Como nos disse o Papa Francisco na Fratelli Tutti (217): “ao encontrar o amor de Cristo, tornamo-nos capazes de tecer laços fraternos, de reconhecer a dignidade de cada ser humano e de cuidar juntos da nossa Casa Comum”.
Dia 27 de junho. Nesta data, há 117 anos, Minas Gerais nos dava de presente um de seus mais ilustres escritores: João Guimarães Rosa (1980-1967). Guimaraes Rosa é considerado por muitos o maior escritor do século XX. Literalmente, me apaixonei por este escritor, depois que li “Grande Sertão Veredas”, uma das mais importantes da literatura brasileira. Ali está presente, através da linguagem e pela originalidade de estilo, o relato de Riobaldo, ex-jagunço que relembra suas lutas, seus medos e o amor reprimido por Diadorim. Publicado em 1956, é considerada uma das mais significativas obras da literatura brasileira. Vejo-me um pouco em Riobaldo, quando ele diz de si mesmo: “Eu sou é eu mesmo. Diverjo de todo o mundo… Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa”.
Só não desconfio da fé que trago em mim e da admiração que tenho pelo nosso pastor das causas da vida do Araguaia. Rezei como faço uma vez por semana, na tumba de Pedro, às margens do Araguaia. O antigo cemitério do povo Iny (Karajá), onde está sepultado nosso poeta, místico profeta, está lindo como que, depois que os estudantes das escolas públicas de São Félix do Araguaia, registraram seus grafismos nas paredes externas daquele lugar sagrado. Tudo retratando a vida e o pensamento de nosso pastor. Cada grafismo mais lindo que outro. Rezei pedindo a intercessão de Pedro por todas as causas que fazem parte da nossa luta diária, por vida digna e igualdade para a sociedade do bem viver que está presente no sonho de Deus para nós.
O coração amoroso de Deus é pleno de misericórdia, ternura e compaixão pelos seus. Assim como nosso Pedro, que deu a sua vida pelas causas do Reino, refleti nesta manhã uma das falas de Paulo na Carta aos Romanos quando afirma: “Sabemos que todas as coisas concorrem para o bem dos que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o projeto dele”. (Rom 8,28) Todos e cada um de nós, somos parte desta família, chamados a tornarmos imagem do seu Filho, reunindo em torno da grande família de Deus. Lembrando que este projeto não exclui ninguém. Mas somos livres para aceitar ou recusar tal projeto, escolhendo entre a vida e/ou a morte, salvar-nos ou condenar-nos. Deus não se sente feliz com a morte do pecador. Pelo contrário, em Jesus, Ele ressalta o mistério do amor do Pai que se alegra em acolher o pecador arrependido ao lado do justo que persevera. Que o nosso coração pulse no mesmo compasso das coordenadas do Coração de Jesus!
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