Quarta feira da Quarta Semana do Tempo Comum.

Fevereiro chegou!

Francisco (Chico) Machado. Missionário e escritor.

Estamos no 32º dia do ano do Calendário Gregoriano. Daqui até o final do ano faltam exatos 333 dias para acabar o ano de 2023. Muito chão pela frente. Muitas tarefas a serem realizadas. Muitos compromissos a serem assumidos. Passar pela vida fazendo o melhor que podemos ser em todas as circunstâncias. Não economizar nas atitudes em defesa da vida. Não contentar com o mínimo que podemos dar. Diante deste contexto, devemos lembrar sempre das clássicas perguntas: qual a marca que deixaremos como legado depois de passar por esta vida? Como as pessoas lembrarão de nós, depois da nossa partida? Que frutos restarão?

Rezei nesta manhã ao som do cantor e compositor nordestino Geraldo Azevedo: “Quando fevereiro chegar. Saudade já não mata a gente. A chama continua no ar. O fogo vai deixar semente”. Mais uma vez contemplei a natureza silente do meu quintal, com os meus convivas prolongando um pouco mais no convívio do calor de seus abrigos em meio às árvores. Deixei-me invadir pelo espírito franciscano, sendo Francisco, mas não o de Assis. A Mãe Natureza, sábia como é, nos trazendo a presença teofânica de Deus, numa atitude de integração total de todos os seres, nos fazendo acreditar no sonho da “Casa Comum”. Sabedoria que vem de Deus e nos renova por inteiro. Sabedoria experimentada pela fé.

Deus nos criou à sua imagem e semelhança (Gn 1,26-28). Ao assim nos plasmar no ceio do Cosmo, não intencionou Deus que o ser humano fosse um ser superior aos demais seres. Os povos indígenas, mesmo sem ter tido contato com o texto bíblico, souberam interpretar esta realidade de uma forma bem mais coerente do que a nós, não-indígenas, que nos julgamos os maiorais em relação aos demais seres que fazem parte do universo da Mãe Natureza. Somos todos pertencentes a “Oikos”, termo grego que significa a “casa”, a “morada”, o “ambiente comum” que nos permite entender que “tudo está interligado”. É por meio desta compreensão maior que somos desafiados a criar entre nós uma harmonia das diferenças em unidade. Unidade na diversidade.

Sabedoria que vem de Deus. Sabedoria “teologal” de um Deus que muito ama. Sabedoria que precisamos incorporar à nossa forma de viver numa perspectiva de diversidade, formando um todo. Sabedoria que vem da nossa fé, não como compreensão desta fé como um tipo de sentimento, que provoca emoções e, às vezes faz chorar emotivamente. A fé precisa ser entendida dentro do contexto bíblico, que é uma mudança profunda de mentalidade, de atitude, de pensamento, que leva a pessoa a assumir compromissos na sua adesão ao Projeto de Deus trazido por Jesus. Somente através de uma fé consistente, podemos enxergar o futuro, com a certeza daquilo que esperamos. Foi por meio desta fé que o povo bíblico teve a certeza das promessas de Deus, confiando em seu poder.

A temática central que nos é trazida pela liturgia do dia de hoje é a sabedoria. Sabedoria que vem de Jesus. As pessoas, ali a sua volta, ficaram admiradas de ver esta sabedoria que dele vinha. Tanto que agiram movidos pelo preconceito, discriminação e pela marginalização: “Este homem não é o carpinteiro, filho de Maria e irmão de Tiago, de Joset, de Judas e de Simão? Suas irmãs não moram aqui conosco? E ficaram escandalizados por causa dele”. (Mc 6,3) Não admitiam que alguém do meio deles pudesse ser diferenciado e possuir a sabedoria que provinha de Deus. Diante desta reação daquela gente, Jesus ficou profundamente admirado com a falta de fé deles. Por conta disso, não realizou nenhum milagre ali.

O texto fala que Jesus está em Nazaré, sua terra. Seus concidadãos se escandalizam com os ensinamentos dele: não aceitam e não querem admitir que alguém como eles possa ter sabedoria superior à dos profissionais e realize ações que indiquem uma presença de Deus. Resumindo, poderíamos dizer que o empecilho para a fé deles é a encarnação: Deus feito homem, situado num contexto geográfico e social concreto ali no meio deles. Nós também agimos assim diante de vários contextos que vivenciamos ao longo da vida. Não acreditamos nos pequenos que convivem lado a lado conosco. Preferimos apostar as nossas fichas nas pessoas que vem de fora, valorizando-as, enquanto ao nosso redor estão aquelas pessoas que fazem acontecer as transformações necessárias para uma vida melhor para todos e todas. Como diria o escritor e poeta peruano Sofocleto (1926-2004): “Ter fé é muito simples. Difícil é acreditar nela”. Não basta ter fé, é preciso ter sabedoria para poder nela acreditar.