Quinta feira da segunda semana do Advento.

Uma manhã de muita chuva aqui pelas bandas do Araguaia. São Pedro não economizou durante a noite, abrindo todas as suas torneiras. Meu quintal amanheceu num silêncio de mosteiro.

Francisco (Chico) Machado. Escritor e Missionário.

Timidamente meus visitantes sacudiam a água de suas plumagens. Rezei contemplando a Senhora de Guadalupe, mãe de todos os povos indígenas. Tudo porque, neste dia 9 de dezembro, a Igreja celebra a festa de São Juan Diego Cuauhtlatoatzin (1474-1548). Um santo indígena mexicano da etnia Asteca, nascido em 1474. Pertencia ao Império Asteca e seu nome de origem significava “Águia que fala”. Este povo foi barbaramente colonizado pelos espanhóis na pessoa de Hernán Cortés, a partir de 1519. Entretanto, com a chegada dos franciscanos ao México, no ano 1524, este povo foi atraído ao campo de missão. Como era de praxe acontecer, Juan Diego, recebeu o batismo aos 50 anos de idade.

Segundo relatos históricos, este indígena experimentou em si uma das aparições de Nossa Senhora. No dia 9 de dezembro de 1531, por volta de três horas e meia, durante uma de suas idas à igreja, em Tepeyac, ocorreu a primeira aparição da Virgem de Guadalupe. Este local hoje é chamado de “Capela do Cerrinho”, onde Nossa Senhora teria chamado em sua língua nativa, nahuatl, dizendo: “Joãozinho, João Dieguito”, “o mais humilde de meus filhos”, “meu filho caçula”, “meu queridinho”. Graças a ele, a Igreja mantém a tradição de louvar a Virgem Maria de Guadalupe. A senhora com rosto e traços indígenas, para desespero de seus colonizadores.

A beatificação de Juan Diego aconteceu em 6 de maio de 1990, pelo então Papa João Paulo II, no México. Doze anos depois foi canonizado em 31 de julho de 2002. O Papa João Paulo II designou a festa litúrgica em louvor a São Juan Diego no dia 9 de dezembro, dia em que aconteceu a primeira aparição de Nossa Senhora de Guadalupe. Aqui no Brasil, esta não é uma festa muito conhecida, entretanto, assim que cheguei à Prelazia, percebi que o nosso bispo Pedro tinha uma veneração especial à Senhora de Guadalupe. Foi para ela que ele, juntamente com Pedro Tierra e Martin Coplas compôs esta bela canção, Morena de Guadalupe.

https://www.youtube.com/watch?v=4BG49FVwp0M

Por falar em Pedro, ontem completou um ano e quatro meses de sua páscoa. Isto serviu-nos de motivação para rezar na tarde de ontem o Ofício Divino, junto ao seu túmulo. Várias mulheres mais antigas da prelazia se juntaram a nós. As “enfrentantes”, como costumamos dizer por aqui. Foi um momento muito emocionante de profunda oração. Uma energia irradiava no semblante de cada uma daquelas pessoas que ali se encontravam. Foi como se Pedro estivesse vivo e presente ali, insuflando em cada um de nós a força para continuar na teimosia que lhe caracterizava. São Pedro também se fez presente, pois até o meio da tarde, estava prometendo um temporal. De repente abriu-se um clarão, possibilitando a nossa estada ali rezando junto deste outro Pedro.

Celebrar a festa de Juan Diego é celebrar a festa da Virgem de Guadalupe. Ainda mais neste contexto em que os povos indígenas seguem sendo ameaçados pelas forças da morte. As terras indígenas dificilmente serão demarcadas, a depender dos nossos (des) governantes atuais. O mandatário maior da nação, já comemora mais um voto contra o “Marco Temporal”. “Vai votar a nosso favor”, assegurou no seu infeliz comentário. Ou seja, a depender dos grileiros das terras indígenas, o Marco Temporal terá um desfecho contrário aos interesses dos verdadeiros donos destas terras, que anseiam por ver os seus territórios demarcados e sem a presença incômoda de madeireiros, agropecuaristas, sojicultores e garimpeiros. Terras indígenas estas que não chegam nem sequer a 13% de todo o território nacional, que é constituído em sua totalidade de 8 milhões e meio de quilômetros quadrados (8.516.000 km²). De saber que os povos que aqui sempre habitaram eram donos exclusivos de todas estas terras.

Como mesmo predisse a “Missa da Terra sem Males”: “América Ameríndia, ainda na Paixão: um dia tua Morte terá Ressurreição!” Este é o sonho de todos os povos ameríndios. Que todos os dias sejam dias do “Bem viver”! Como disse o profeta Isaias no texto da liturgia de hoje: “Eu sou o Senhor, teu Deus, que te tomo pela mão e te digo: Não tenhas medo; eu te ajudarei. (Is 41,13) Por mais que a situação seja dificil e a gente pensa em desanimar, é sempre bom saber que Deus está do lado dos pequenos. Os oprimidos tem sempre um defensor, que é o próprio Deus em pessoa. Por este motivo, não podemos perder a esperança, pois o Senhor Deus é o nosso protetor e libertador, sempre pronto a nos defender, seja em que circunstâncias for.

https://www.youtube.com/watch?v=2CX_IXifhvw

 

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