Quinta feira da 24ª Semana do Tempo Comum. O mês de setembro segue nos direcionando rumo à primavera, que terá o seu início no dia 22 próximo, mais precisamente, às 15:00 horas, no horário de Brasília. Aqui pelas nossas bandas já podemos ver a manifestação direta desta estação, já que, aqui e acolá, as flores, sobretudo dos Ipês, nas mais variadas cores colorem o horizonte. Em sua Antologia Poética, publicada em 2001, a maior poeta do Modernismo Brasileiro (não gostava de ser chamada de “poetisa”, por considerar um diminutivo pejorativo), Cecília Meireles (1901-1964), se referia a esta estação com estas letras: “Aprendi com as primaveras a deixar-me cortar e a voltar sempre inteira”. Eu que não sou poeta, rendo-me as palavras desta carioca, pois a cada momento da vida, temos que aprender a fazer as “podas necessárias”, para que possamos crescer mais fortes, em direção às nossas realizações.
Depois dos últimos acontecimentos ocorridos no cenário politico nacional, nosso amanhecer nesta quinta feira ainda aconteceu de forma taciturna. Por este motivo, antecipei a minha visita, e fui buscar forças e energias na “Catacumba de Pedro”. Como nunca se escondeu de sua opção politica pelos sofredores, se ainda presente no meio de nós, com sua teimosia resistente, nosso bispo estaria furioso com esta camarilha, que assaltou o Congresso Nacional, legislando em causa própria e de suas falcatruas. Ele que sempre nos incentivou a posicionar também de forma politica contra as injustiças, aconselhando-nos: “Optem pela militância social e política, também. Se a nossa fé; nossa opção pelo Reino não se traduzir em prática social e política, então ficaremos pelo meio do caminho”. Saí daquele espaço místico, de cabeça erguida, ao saber que estou do lado certo: dos pobres, dos indígenas e dos marginalizados. Um com eles, nas causas deles!
Uma quinta feira em que Lucas nos traz um dos mais belos textos do Novo Testamento, quando uma mulher anônima, demonstrando o amor que transborda de seu coração, lava com as lágrimas e enxuga com os cabelos, os pés de Jesus de Nazaré, ungindo-os posteriormente com perfume. Aliás, os Evangelhos narram três ocasiões em que Jesus foi ungido com óleo ou perfume caro: uma mulher pecadora, que derramou perfume caro e lágrimas sobre os pés de Jesus (Lc 7,36-50); outra em que Maria de Betânia derramou nardo puro sobre os Seus pés (Jo 12,1-8, 11,1-2); e, por fim, outra na casa de Simão, o leproso, em que uma mulher não identificada derramou um perfume precioso sobre a Sua cabeça (Mt 26,6-13; Mc 14,3-9) Ambos os casos são apresentados como uma preparação simbólica para a morte iminente de Jesus.
Jesus convidado por um fariseu para estar em sua casa e sentar-se com ele à mesa. Atitude considerada um escândalo pelas autoridades religiosas. Tudo o que não podia acontecer, com aquele que se dizia o Messias enviado, pois estar com pecadores, é deixar-se contaminar por eles. Em meio aquele contexto, uma mulher anônima, taxada como pecadora, invadiu o espaço e toca em Jesus. Uma mulher triplamente marginalizada, por ser mulher, pobre e prostituta, já que para a cultura da época, as mulheres que eram prostitutas enfrentavam o desprezo da sociedade, sendo consideradas ética e moralmente inferiores e excluídas da vida social. Jesus comendo com um fariseu, adversários ferrenhos de seu messianismo, sendo tocado por uma mulher marginalizada, despertando o comentário maldoso do fariseu: “Se este homem fosse um profeta, saberia que tipo de mulher está tocando nele, pois é uma pecadora”. (Lc 7,39)
Os fariseus, de maneira geral, não se consideravam pecadores: “Ó Deus, eu te agradeço, porque não sou como os outros homens, que são ladrões, desonestos, adúlteros, nem como esse cobrador de impostos”. (Lc 18,11) Se colocavam acima das demais pessoas e, com a sua empáfia, desconsideravam as pessoas à sua volta, principalmente aquela mulher “pecadora”, roubando a cena em sua casa. Vinda da periferia da marginalização, aquela mulher, com o seu gesto de carinho, dá uma grande demonstração de amorosidade para com Jesus, reconhecendo n’Ele, Aquele que veio devolver a dignidade para todas as pessoas marginalizadas pela classe religiosa da Palestina de seu tempo.
Já o fariseu, ficando na sua atitude de julgamento, perde a grande chance de aprender com Jesus que Deus é partidário dos pobres e marginalizados. Ele não foi capaz de entender e experimentar o perdão, o amor e a misericórdia compassiva de Deus, manifesta na pessoa concreta de Jesus ali com ele. Por outro lado, Jesus lhe mostra que a justiça de Deus se manifesta como amor que perdoa os pecados e transforma as condições das pessoas. O amor é expressão e sinal do perdão recebido. Como profeta enviado em nome do Deus salvador/libertador, Jesus empodera àquela mulher e lhe diz: “Tua fé te salvou. Vai em paz!” (Lc 7,50) Uma demonstração clara de que a ação de Jesus não é apenas um espetáculo de poder, mas um ato de amor incondicional que liberta as pessoas do sofrimento, do mal e da marginalização social.
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