Francisco (Chico) Machado. Missionário e escritor.

Sábado Santo. O sábado mais longo de todos os dias da história. Sábado do silenciar. Dia do recolhimento e meditação. Dia de mesclar a dor da morte de Jesus com a alegria esperançosa de sua Ressurreição. Dia de calar para ouvir nossa voz interior e as vozes de tantos quantos estão sendo crucificados na história. Silenciar não de um silêncio cúmplice, covarde da indiferença (Pilatos), mas o silêncio ativo que nos faz ouvir o clamor de todos os que sofrem com suas cruzes, impostas pelo poder dos grandes e poderosos, que continuam matando os “Jesuses” de hoje, em nome de Jesus.

Sábado da Vigília Pascal. Este dia faz parte da liturgia da Páscoa da Ressurreição. Coube ao Papa Pio XII, que exerceu o seu Pontificado entre os anos de 1939-1958, com a sua Reforma Litúrgica, definir o “Sábado Santo” como “o dia do silêncio”. Um dia de dor para ser lembrado que a nossa fé está sendo provada, através da teimosa resistência, permitindo assim que o nosso vazio interior seja preenchido pelo esperançar da Ressurreição. Mesmo que tudo esteja em silêncio, Jesus continua agindo em e através de nós como esperança viva de Deus.

Sábado da espera vigilante “freiriana”, de quem acredita em si e nos demais que somam e se juntam, fazendo acontecer na história, a libertação que todos esperamos na pessoa do Ressuscitado. O silêncio meditativo da contemplação não pode ser o da inatividade e do conformismo daqueles que relativizam e naturalizam a morte dos pobres, como parte de si mesmo ou da vontade de Deus, numa hermenêutica equivocada do: “Pobres sempre tereis” (Jo 12,8). Jesus também foi assassinado em nome do “deus” da religião do Templo de Jerusalém. Ele continua morrendo nos templos de agora, tudo em nome da religião. Tem razão o Papa Francisco quando afirma que: “chegou a hora e acordar desse fundamentalismo que contamina e corrói todos os credos”.

Crucificaram o amor. Jesus que traz em seu corpo as marcas da paixão. Os algozes da morte levaram o amor de Deus à cruz dos malfeitores. Um conluio feito às claras entre o poder do Estado e o poder religioso, com a conivência dos pobres que se deixaram enganar, sujando suas mãos com o sangue do inocente. Cumprindo as profecias, Jesus é o cordeiro imolado pela expiação dos nossos pecados. Embora imolado, está vivo. O Cordeiro imolado libertou-nos da morte para a vida.

Sábado da espera confiante da manhã do primeiro dia da semana. Sábado da mudança radical de nosso ser pensante e do coração endurecido a respeito da compreensão do ser humano e da vida como um todo. O projeto vivido, defendido e testemunhado por Jesus não nos leva para o caminho da morte. Ao contrário, através da morte, leva-nos à vida plena. Não nos cabe ficar parados acomodados esperando pela hora de agir. O dia é hoje e a hora é agora, como as mulheres que não se acovardaram, mas foram até o túmulo de Jesus, testemunhando a sua teofania (manifestação de Deus): “o anjo disse às mulheres: Não tenhais medo! Sei que procurais Jesus, que foi crucificado. Ele não está aqui! Ressuscitou, como havia dito! (Mt 28, 5-6)

Mais uma vez o protagonismo feminino das mulheres guerreiras, falando mais alto na história de vida de Jesus. Mulheres destemidas que vão à luta e são a primeiras testemunhas oculares do Ressuscitado. Maria Madalena e a outra Maria, com esperançosa expectativa, permaneceram confiantes, mantendo viva em seus corações a chama da fé na Ressurreição. Elas acreditaram esperançando e nos mostrando que não é hora de ficarmos estáticos, a espera que algo possa acontecer. O Amor crucificado é o mesmo Ressuscitado e está vivo em nós.

Sábado Santo do silêncio. Contemplar, Refletir e meditar sobre a vida ameaçada diuturnamente pelas armas da morte. Silenciar para escutar nossa voz interior e a voz de Deus que nos vem de todos os machucados e maltratados da história. Tempo de silenciar a fome de tantas vidas ameaçadas e mortas; silenciar o ódio que fere e mata nas relações; silenciar a indiferença de quem não vê e sente a dor do outro; silenciar as vozes da mentira, disseminando ódio; silenciar o preconceito que fere e mata; silenciar o machismo, a misoginia e o feminicídio que ferem de morte os corpos e a alma dos nossos irmãos e irmãs. Silenciar para acolher em nós a força viva do Ressuscitado, dom maior e nossa alegria de viver na plenitude que Deus quer. Por amor a nós Ele morreu e por amor a ele devemos viver. Só uma fé ativa transformará o medo da morte na alegria da vida.