Francisco (Chico) Machado. Missionário e escritor.

Quinta feira da Oitava da Páscoa.
Estamos em pleno período litúrgico denominado de “Oitava da Páscoa”. É o Tempo Pascal, ou seja, os oito primeiros dias que vão do domingo de Páscoa até o domingo seguinte, da misericórdia. Neste período, a liturgia nos reserva os textos do Evangelho que tratam dos relatos do Cristo Ressuscitado, indo de encontro aos seus seguidores e seguidoras mais próximos. Ainda num clima de medo, insegurança e incertezas, apesar do Mestre os terem preparados para este dia que haveria de chegar. Da mesma forma que as primeiras leituras deste período, são extraídas dos Atos dos Apóstolos, que relatam para nós os primeiros passos da caminhada da Igreja primitiva.

Por falar em Igreja primitiva, ontem foi aniversário de vida sacerdotal de um dos seguidores de Jesus, que faz questão de trilhar os passos do Mestre, a exemplo das primeiras comunidades cristãs. Padre Júlio Renato Lancellotti, completou no dia de ontem 37 anos de vida sacerdotal. Ele que fora ordenado por Dom Luciano Mendes de Almeida, em 20 de abril de 1985, na cidade de São Paulo. A época iniciava eu o curso de Teologia no ITESP, e me fiz presente naquela linda celebração. Um grande amigo de caminhada, que sempre trabalhou com os mais vulneráveis da “Pauliceia Desvairada”. Quando migrei da zona Leste de São Paulo, para a Prelazia de São Félix do Araguaia, no Mato Grosso (1992), ele comentou comigo: “Eu não teria esta sua coragem”. Eu simplesmente lhe disse: Oh quem fala em coragem!

Os primeiros passos da comunidade dos seguidores e seguidoras de Jesus é ainda de muito medo e insegurança. Estão no limiar entre o medo e a necessidade de coragem para o testemunho. O mesmo ocorre conosco. Somos ou queremos ser a Igreja do Cristo Ressuscitado. O testemunho das comunidades primitivas nos serve de balizamento. Acreditar que Jesus está vivo, na pessoa do Ressuscitado requer, além do anúncio, o testemunho vivo, através das ações que se perpetuam na história humana. Através do testemunho, a comunidade anuncia Jesus como o Santo, o Justo, o Profeta definitivo e o Servo-Messias, que vai transformar radicalmente a condição humana, realizando na história o projeto de Deus, dando vida nova à todas as coisas. Daqui por diante, a ação de Deus em favor das pessoas se realiza mediante o nome do Filho de Deus, que ressuscitado vive entre os seus.

“Este é o dia que o Senhor fez para nós, alegremo-nos e nele exultemos” (Sl 118,24). O tema gerador e fundante da nossa fé cristã é a Ressurreição de Jesus. Nela está contida toda a nossa razão de ser cristãos. Se somos homens e mulheres de fé, devemos isto a vitória de Deus, descendo o seu Filho da Cruz, dando-lhe vida nova. Desta forma, a ressurreição não é fruto da imaginação dos discípulos e discípulas de Jesus, nem se reduz a fenômeno meramente espiritual. A ressurreição é um acontecimento histórico teológico que atinge o próprio corpo machucado; daí a identidade do ressuscitado com o Jesus histórico de Nazaré. A partir daí, qualquer ação humana coerente que proporciona mais vida para os corpos crucificados: oprimidos, doentes, torturados, famintos e sedentos, não é apenas obra de misericórdia, mas é sinal concreto do fato central da fé cristã: a ressurreição do corpo do próprio Jesus, o Nazareno.

Jesus ressuscitado se coloca no meio dos seus. Ele se faz presente vivo entre eles: “Jesus apareceu no meio deles e lhes disse: A paz esteja convosco!” (Lc 24,36) Ele sabe que os seus estavam ainda amedrontados. Por este motivo os encoraja para a missão de dar continuidade ao seu projeto. A missão e o testemunho requerem coragem por parte daquele e daquela que se põe na caminhada consigo. Quem se deixa dominar pelo medo compromete a missão, já que o medo inibe a ação. Ainda mais que a missão precisa ser continuada por intermédio do anúncio/testemunho deste Jesus a todas as pessoas, provocando assim a transformação da história a partir da atividade de Jesus voltada para os empobrecidos e vulneráveis.

Todavia, nada disso acontece sem que haja a conversão: mudança radical de vida, de atitude e de pensamento. Conversão que é, antes de tudo, um ato de amor. Conversão movida pelo amor. Tanto a conversão como o perdão pressupõem percorrermos o mesmo caminho de Jesus na própria vida e nos acontecimentos da história. Estando juntos com Ele, perceberemos que a nossa missão será iluminada pelo Espírito do Pai, a força que vem do alto, como fica explícito no texto dos Atos dos Apóstolos: “O Espírito Santo descerá sobre vocês, e dele receberão força para serem as minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia e Samaria, e até os extremos da terra.” (At 1,8). Nossa missão é evangelizar com Ele: “Jesus, o primeiro e maior evangelizador”. (Papa Francisco) Missão que se estende por toda a vida até o dia do encontro final da nossa páscoa na Páscoa d’Ele.