Quarto domingo do tempo comum.

O domingo é um dia especial para os cristãos. Dia sagrado de merecido descanso. Dia também de estar presente na comunidade para celebrar o dom da vida e alimentar do Pão Eucarístico, onde fazemos o memorial da Ceia do Senhor, sua Paixão, Morte e Ressurreição. A vitória da vida sobre a morte. Não um dia apenas para cumprir o preceito de participar de um dos sacramentos da Igreja, mas fortalecidos com este Pão da vida, estabeleçamos o compromisso de uma fé encarnada no contexto sócio-histórico, de adesão ao Projeto de Deus revelado por Jesus.

Estamos no Ano C da liturgia. Como de praxe, fazemos a lei do Evangelho de Lucas. O texto de hoje é a continuidade do domingo anterior, onde Jesus, na sinagoga, faz a leitura de uma das passagens do Profeta Isaías (Is 61, 1-2) Antes, porem de entrar no contexto literário em questão, é bom lembrar que este evangelista tem um propósito muito claro, ao fazer a sua narrativa. Lucas nos apresenta o caminho percorrido por Jesus. Caminho da salvação, cujo centro de referência é a cidade de Jerusalém, ponto de chegada do itinerário deste Jesus. Um caminho que se realiza na história humana, elucidando para nós a atividade pública de Jesus em favor dos empobrecidos, doentes, mulheres, estrangeiros, pagãos.

Jesus que se vê naquilo que fora escrito pelo profeta Isaías: “Hoje se cumpriu esta passagem da Escritura que acabastes de ouvir” (Lc 4, 21). Ou seja, a sua missão messiânica, sendo aludida pelo profeta. Inicialmente, Jesus é causa admiração para as pessoas. Suas palavras, seus ensinamentos, despertam um sentimento de acolhida até o momento em que estas pessoas olham para Jesus com olhares eivados de preconceito: “Não é este o filho de José?” (Lc 4, 22), numa atitude discriminatória para com os pobres, pois sabiam a origem humilde do Nazareno. Na verdade, eles queriam que Jesus fizesse entre os seus os mesmos milagres que havia feito em Cafarnaum.

A situação se complica para Jesus quando Ele justifica a razão de sua vinda e quais eram os destinatários primeiros de sua atividade messiânica. Evidentemente que a vinda do Senhor foi para todos, mas a partir da realidade de exclusão, discriminação e rejeição dos mais vulneráveis, religiosa, política e socialmente. Em Jesus, Deus abre o horizonte de perspectiva, indo ao encontro daqueles que estão além das fronteiras culturais, religiosas, sociais e geográficas da história: estrangeiros, mulheres, doentes, marginalizados, inclusive os pagãos. Isso desperta toda a ira das lideranças político-religiosas ali presentes na sinagoga.

Quando o Papa Francisco propõe uma “Igreja em saída”, nada mais é do que possibilitar que a Igreja esteja em sintonia com o Projeto de Jesus, sendo fiel no seu seguimento. Igreja que se abre para além das fronteiras do círculo clerical sacramentalista e da vivência de preceitos vazios de compromisso com o caminho traçado e percorrido por Jesus de Nazaré. Sair de uma Igreja fechada sobre si mesma, uma Igreja de sacristia, onde o dom de servir deu lugar ao carreirismo e a busca desenfreada pelo poder e pelo dinheiro, à custa de pobres cada vez mais pobres. Daí entendermos o porquê do Papa Francisco encontrar tamanha resistência em seu pontificado, principalmente nos círculos eclesiásticos e nos grupos cristãos mais conservadores, uma vez que se sentem ameaçados em seus privilégios de classe mais abastada.

Ser “Igreja em saída” é trilhar o mesmo itinerário percorrido por Jesus, indo para além das fronteiras do poder, dos palácios, dos espaços sagrados, das negociatas dos poderosos, das questões de gênero, de sexualidade, dos dogmas e preceitos morais. “Tem de ir aonde o povo está”, como bem disse Milton Nascimento. É estar presente na diáspora. Se para a compreensão judaica do tempo de Jesus, se referia ao conjunto de comunidades marginalizadas que viviam fora da Palestina, na história atual, a nossa sociedade também produz as suas diásporas. É para elas que devem ser destinados os nossos olhares e o nosso compromisso de cristãos que seguem a Jesus,

O texto do Evangelho de hoje conclui dizendo que: “Jesus, porém, passando pelo meio deles, continuou o seu caminho”. (Lc 4, 30) Igreja que se faz no caminho. Ser Igreja na caminhada. Igreja peregrina das causas do Reino, fazendo-o acontecer no transitar da história. “Igreja pobre com os pobres e para os pobres e contra pobreza”, como nosso bispo Pedro, fazia questão que fosse a nossa Igreja da Prelazia de São Félix. “A opção pelos pobres não é uma opção sociológica, não é a moda de um pontificado. É uma exigência evangélica”, atesta o Papa Francisco. Até porque a injustiça é a raiz perversa da pobreza e fonte de uma sociedade constituída de desigualdades. O limite para Deus é a vida sem limites no amor. Vem caminheiro, o caminho é caminhar!

https://www.youtube.com/watch?v=f0_vmb2sXiM