A Carta de Dom Milton Kenan Junior
Bispo de Barretos – SP

Caros Padres:

O suicídio do Pe. Geraldo de Oliveira no dia 02/02 (o 16° nestes últimos meses) deixa-nos todos como que nus diante da realidade triste que nos cerca.

Até agora, ouvimos muitas acusações, a procura desesperada pelos responsáveis por estas tragédias. Anônimos, e ao mesmo tempo padres com experiência pastoral, apostam que isso se deve à instituição que não cuida dos seus ministros, outros veem na morte destes padres a comprovação dos efeitos nefastos da Síndrome de Burnout.

Creio que todos têm uma certa medida de razão. Mas, a carta do Padre Geraldo colocou à luz em algo que podemos chamar de trivial entre nós, e que está matando padres e continuará matando se não tivermos a lucidez de romper com isso.

Há anos acompanhei um irmão padre rotulado como desequilibrado, bipolar, etc, ao psiquiatra que o acompanhava. E na hora que estive na companhia do padre na presença do psiquiatra, este dizia da infâmia que aquele padre sofria, vítima dos rótulos que pesavam sobre ele. Hoje este padre exerce seu ministério sem surtos, nem crises… encontrou a dignidade que lhe era tirada. Somos mestres nisso, não é mesmo?

Rotular, desprezar, ignorar, boicotar… porque aquele irmão não pensa como eu, porque o outro ousa ser diferente… e não poucas vezes na minha vida encontrei com casos perdidos que graças a uma mão estendida reencontraram a alegria do ministério.

Como bispo digo que a realidade episcopal não é diferente. Há muitos bispos que perderam o ardor pastoral por serem tratados como vilões. Se é doloroso desprezar e rotular um padre, vocês não sabem o que é isso para um bispo. Afinal todos estamos na mesma barca, possivelmente a barca de Cristo! E se há algo que Jesus jamais negociou foi com a hipocrisia. Acolheu pecadores, gente da pior espécie, mas nunca hipócritas, aquele tipo de gente que apunhala pelas costas, que elogia na frente e difama por trás, que vive sob uma máscara, como um ator de teatro. Não! Para esses Jesus chamava: “raças de víboras!”

Por que há padres cometendo suicídio, por que há padres e bispos que já sepultaram a vocação? Porque não encontraram quem se sentasse com eles, para ouvi-los; porque não encontraram alguém que os olhasse sem julgá-los. Se deixarmos para mais tarde a decisão de romper com esta lógica continuarão a multiplicar os casos como do Padre Geraldo que depois de 50 anos de sacerdócio procurou a dignidade na morte por própria conta.
Como bispo da Igreja, obrigado Pe. Geraldo pelo seu ministério!

Dom Milton Kenan Junior
Bispo de Barretos – SP