Quinta feira da Vigésima Terceira Semana do Tempo Comum. Setembro é o mês da Bíblia, das flores da primavera, mas também do Cerrado. No dia 11 de setembro, comemoramos o Dia Nacional do Cerrado. Ele que é o maior bioma da América do Sul e o segundo maior bioma do Brasil, compreendendo cerca de 22% do território brasileiro. Com 2.045.000 km², caracteriza-se por ser uma região de savana, estendendo-se por cerca de 200 milhões de quilômetros quadrados. Sua formação vegetal caracteriza-se pela biodiversidade e grande potencial aquífero, no entanto, é considerado atualmente o segundo bioma do Brasil mais ameaçado. Neste Dia do Cerrado, devemos lembrar-nos da importância de preservar este bioma e conservá-lo, garantindo que as gerações futuras possam desfrutar da beleza e da riqueza do Cerrado.

Como bom mineiro que sou, adotei a causa indígena como a minha causa maior. É por este motivo que permaneci aqui pelas bandas da Prelazia de São Félix do Araguaia. Por aqui, também predomina o bioma Cerrado, cobrindo uma área de 40% do estado, mas enfrenta desmatamento significativo, primeiramente para a agropecuária e agora para o Agronegócio. Triste saber destes dados, uma vez que este bioma é crucial, conhecido como o “berço das águas” por abastecer grandes bacias hidrográficas e abrigar uma rica fauna e flora. O Estado de Mato Grosso está entre aqueles que mais perderam a sua vegetação nativa do Cerrado nas últimas décadas, com 6,8 milhões de hectares desmatados entre 1985 e 2020, em grande parte devido à expansão da soja e do milho, com vistas à exportação. Os nossos indígenas aqui sabem que a luta pela preservação da Amazônia é uma luta pela vida, pela água limpa, pelo ar puro e por um futuro em harmonia com a Mãe Natureza.

A preservação da natureza é sumamente importante, mas hoje estamos também diante de um grande desafio proposto por Jesus, no texto da liturgia desta quinta feira: “Sede misericordiosos, como também o vosso Pai é misericordioso”. (Lc 6,36). Para alcançar esta misericórdia que é a essência divina do Ser de Deus, precisamos exercitar o perdão como um ato teológico. Entendendo que o perdão, como ato teológico, é visto no contexto bíblico como a ação de Deus em absolver e perdoar os pecados humanos. Ato este onde predomina a misericórdia e a graça que afasta as transgressões, sendo um fundamento para a libertação humana. Neste sentido nós, seres humanos, somos chamados a refletir o perdão divino de Deus, perdoando a quem nos ofendeu como um ato de fé, obediência e amorosidade, libertando-nos do peso da mágoa, do rancor, do ódio, da vingança, promovendo a reconciliação e a paz entre nós.

Além de ser um ato teológico, o perdão também é um ato pedagógico. Exercitar o perdão exige um processo educativo de amadurecimento na fé, e de uma caminhada em direção ao Ser misericordioso e amoroso de Deus. Uma atitude que requer humildade, e abertura para que o amor de Deus habite o mais profundo de nosso ser, dando as coordenadas das nossas ações no dia a dia. Perdoar não é simplesmente dizer: “eu te perdoou!”, mas antes sentir que este ato de perdoar vem lá de dentro do nosso coração, onde a misericórdia de Deus habita, e está pronta a se fazer presente nas nossas relações. Quem perdoa desta forma, faz bem ao ser que é perdoado, mas antes àquele ou àquela que se deu em perdão, como ato mais íntimo e profundo de seu coração.

Perdoar não é um ato fácil! Perdoar quem nos faz mal cotidianamente é um dos nossos maiores desafios na convivência de nossa sociedade hoje. Perdoar o opressor, por exemplo, não é concordar ou aceitar que ele continue como opressor. Como diria nosso pedagogo maior, Paulo Freire, a nossa forma de amar e perdoar o opressor, é regatar a humanidade perdida na vida deste, para que não volte nunca mais a ser opressor, libertando o oprimido das suas garras opressoras. É por este motivo que todo perdão carrega em si a dimensão pedagógica do ato pedagógico, como forma de construção de novas relações, em que sejamos mais fraternos, e solidários às causas dos pequenos. Perdoar sempre e de coração aberto, como Jesus sintetiza no texto de Lucas de hoje: “Não julgueis e não sereis julgados; não condeneis e não sereis condenados; perdoai, e sereis perdoados”. (Lc 6,37)

Somos obras da criação de Deus. Fomos criados para sermos felizes e alcançarmos a plenitude das nossas realizações nas relações. Somos seres de relações. Fazemos parte assim, da grande família de Deus e, desta forma, formamos uma grande unidade humana, mesmo vivendo na diversidade. A vida em sociedade é feita de relacionamentos de interesses e reciprocidade, que geram lucro, poder, ambição e prestígio. Jesus vem nos trazer uma realidade de uma nova sociedade, revolucionando o campo das relações humanas, mostrando que, numa sociedade justa e fraterna, as relações devem ser gratuitas, à semelhança do amor misericordioso de Deus Pai. Que saibamos rezar com o salmista que definiu assim o ser de Deus: “O Senhor é misericordioso e justo; o nosso Deus é compassivo”. (Sl 116,5) A experiência mais profunda da libertação nos faz reconhecer a justiça e o amor incondicional que se voltam para os pobres e necessitados de ontem e de hoje.