Neste momento “pós” pandemia, dentre os muitos aprendizados que tivemos, um deles foi descobrir que podemos nos tornar e nos transformar em novas pessoas ao invés de esperarmos por um novo normal.

Dra. Marina Campos. Professora-pesquisadora, Mestra em Mindfulness, escritora e colabora do PORTAL UNESER.

Abrimo-nos a diversas possibilidades e descobrimos que podemos desenvolver novas habilidades. Isso tem nos ajudado a viver de uma forma mais equilibrada e segura.

Os últimos acontecimentos nos mostraram um novo conceito – o do “mundo BANI” (traduzido para o português como: Frágil, Ansioso, Não-linear e Incompreensível). Nesse sentido, constata-se que o conceito de “mundo VUCA” (traduzido para o português como: Mundo Volátil, Incerto, Complexo e Ambíguo) já está desatualizado. Se o mundo VUCA nos angustiava, o mundo BANI nos alerta pois , finalmente, senhoras e senhores, nos demos conta de que somos MORTAIS. O mundo BANI nos convida a perceber a nossa vulnerabilidade e compreender que, com as dificuldades, aprendemos estratégias e criamos ferramentas que nos permitem viver e caminhar com a nossa fragilidade. É momento de cultivar e harmonizar a qualidade das nossas vidas e das nossas relações familiares e profissionais.

A sobrecarga de tarefas e atividades, nas empresas e na vida, faz com que, cada vez mais, vivamos em uma sociedade do cansaço, da angústia e dos transtornos de ansiedade e depressão. A toda hora, nossos conceitos e nossas ideias mudam. Tudo acontece tão rápido que, a cada dia que passa, parece que entendemos menos. Apesar de estarmos constantemente ansiosos, o BANI veio para nos mostrar que, agora, devemos ter mais consciência da existência da ansiedade e que, em vez de apenas reagir, precisamos nos acolher. No livro Self-Compassion (Autocompaixão, em português), escrito por Kristin Neff, há um trecho que, assim como nos avisos de avião, diz: “se faltar oxigênio, máscaras cairão sobre suas cabeças; coloque primeiro em você e depois na pessoa ao seu lado”. Ou seja, se não cuidarmos de nós mesmos, nunca teremos condições de cuidar das outras pessoas.

A tomada de consciência da nossa fragilidade fez com que a maioria de nós passássemos a nos cuidar muito mais. Isso porque nos demos conta da necessidade que temos de parar durante alguns instantes para respirar fundo e olhar para nosso interior a fim de avaliar ,de fato ,o que realmente importa. O mundo BANI está nos ensinando a focar nas coisas que realmente vão nos trazer grandes resultados. No mundo VUCA, precisávamos aprender para poder trabalhar; no mundo BANI, trabalhamos para poder aprender. No mundo VUCA, enxergávamos as nuvens no céu; no mundo BANI, percebemos que há nuvens no céu, mas não acreditamos que as nuvens sejam o céu.

Nunca foi tão exigido de nós, como agora, o desenvolvimento de habilidades como resiliência, claridade e consciência da vulnerabilidade. A frase “Você não pode parar as ondas, mas pode aprender a surfar”, dita por Jon Kabat-Zinn há muitos anos, nunca foi tão bem aplicada como no momento em que estamos vivendo. O mundo BANI faz com que as pessoas valorizem a meditação, a reflexão e a aceitação. O estado de presença não é mais um luxo, mas uma necessidade. O mundo BANI requer agilidade, foco e disciplina!

A certeza dessa fragilidade nos deixa extremamente ansiosos. Mas o antídoto para a nossa ansiedade será, possivelmente, a consciência da vulnerabilidade. Quando olhamos para nossa vulnerabilidade e aceitamos nossas imperfeições, temos a grande oportunidade de exercitar a conexão conosco e com os outros. O mundo BANI está nos ensinando o óbvio: “que cooperar é melhor que competir”, como já disse Yuval Harari em seu livro “Sapiens – Uma breve história da humanidade”.

Ao abraçarmos as nossas imperfeições, dando-nos conta de que somos humanos e criarmos ferramentas para viver da melhor forma no atual cenário, passamos a entender que viver em alta performance nada mais é do que cultivar habilidades que nos tragam bem-estar e qualidade de vida.

No mundo BANI, não basta mais aprender, desaprender e reaprender, como o escritor Alvin Toffler nos ensinou certa vez. O mundo BANI exige toda bagagem adquirida, todas as experiências vividas, pois os desafios não ficarão menores. Sendo assim, somos nós que deveremos estar mais preparados. Na cultura japonesa, existe o termo “Kintsugui”, que significa juntar, colar os pedaços com ouro; daí a filosofia de juntar, abraçar as imperfeições. Quando um objeto como um vaso ou um prato se quebra, os japoneses não utilizam cola transparente para disfarçar e consertar o objeto. Em vez disso, eles aplicam cola dourada, para mostrar ,exatamente , que aquilo fez parte da história daquele vaso, daquele prato, daquele objeto. O mundo BANI exige “colar o que se quebrou com ouro”, valorizando as nossas cicatrizes.

O mundo BANI está aí para nos mostrar que os “pratos vão quebrar” e que nós vamos precisar colar cada um deles e seguir adiante, utilizando os pratos, olhando para a “cola de ouro” e aprendendo ,a cada dia ,que é possível colar, que é possível aprender, que é possível prosseguir.

Sendo assim, não é mais necessário desaprender. De agora em diante, o que precisamos é aprender, reaprender e acolher. Diante disso, as perguntas que surgem são: estamos aptos a mostrar as nossas fragilidades? Temos consciência de nossa vulnerabilidade, uma vez que a vida não é mais linear? Temos consciência daquilo que podemos e daquilo que não podemos mudar?

Se por um lado, no mundo VUCA, fomos apenas expectadores e não tivemos a oportunidade de fazer um bom começo, no mundo BANI, temos a possibilidade de sermos protagonistas e construirmos um excelente final.

Acredite, é possível!

 

“Os textos dos colunistas e colaboradores não refletem necessariamente as opiniões da UNESER.”