Segunda feira da Terceira Semana da Quaresma.

Francisco (Chico) Machado. Missionário e escritor.

Vamos caminhando passo a passo rumo a gloria da Ressurreição. Os percalços do caminho não devem nos desanimar, já que vamos ao encontro da vida nova que nasce da cruz redentora de Jesus. Com a Ressurreição do Filho, Deus quis nos mostrar que a morte não possui a última palavra, mas a vida. “Morte, onde está a sua vitória? (1Cor 15,55), perguntava o apóstolo Paulo. A vitória do morte é a vida. Como bem resumiu Santo Agostinho: “Aos cristãos não é poupado o sofrimento, aliás, a eles cabe um pouco mais, porque viver a fé expressa a coragem de enfrentar a vida e a história mais em profundidade”.

Segunda feira, 13 de março. A semana iniciando e trazendo-nos uma imensa alegria. Nesta data, há exatos 10 anos o argentino Jorge Mário Bergoglio, era anunciado como o 266º Papa da Igreja Católica, sucedendo o Papa Bento XVI, que havia abdicado ao papado em 28 de fevereiro de 2013. O primeiro Papa latino americano assumia o pontificado com o nome de Francisco. Fazendo jus ao “Poverello de Assis”, inicia um longo processo de reestruturação e reconstrução da Igreja Romana, para desespero de alguns poucos, agarrados às estruturas arcaicas de uma instituição que caducou e se perdeu no tempo. 10 anos do pontificado do “Papa da sorriso e da empatia”.

“O Papa do fim do fim do mundo”. Francisco trouxe vida nova para a Igreja. Com o carisma franciscano e o espírito do Concílio Vaticano II (1962-1965), abriu as janelas institucionais do Vaticano, permitindo que o ar fresco do dom do serviço adentrasse as estruturas carcomidas de uma instituição que perdeu o sentido da Igreja das comunidades primitivas de caminhar lado a lado com o povo mais sofrido. Francisco permitiu-nos sonhar com aquela Igreja que nasceu na Quinta Feira Santa, com o gesto revolucionário de Jesus de lavar os pés de seus discípulos e ainda dizer: “Pois bem eu, que sou o Mestre e o Senhor, lavei os seus pés; por isso vocês devem lavar os pés uns dos outros”. (Jo 13,14) Na Igreja de Jesus a autoridade só pode ser entendida como função de serviço aos outros.

“Uma Igreja em Saída”. Passados 10 anos, creio que não há definição melhor para o pontificado de Francisco. Saída em todos os sentidos: sair de dentro do casulo do comodismo e da indiferença; sair de dentro das estruturas burocratizantes do “paroquialismo” voltado para si mesmo; sair do sacramentalismo para acompanhar a vivência da fé e da vida que acontece nas periferias geográficas e existenciais; sair de dentro da roupagem clerical suntuosa, excessivamente exagerada e vestir a camiseta da luta do povo sofrido; sair de dentro das paredes das sacristias que se transformaram em “embaixadas dos sacramentos”, como bem disse o Papa Francisco.

Uma Igreja em Saída para estar literalmente no meio do povo onde ele vive e carrega as suas cruzes. Sair de uma Igreja estruturada em paróquias para uma Igreja de comunidades Povo de Deus, como sempre nos alertava nosso bispo Pedro. Foi desta forma que ele pensou e estruturou a Prelazia de São Félix do Araguaia. Tanto que Pedro ficou muito feliz quando soube que alguém vindo da Teologia da Libertação fora eleito Papa. Todavia, este Papa tem encontrado bastante resistência, mais dentro que de fora da Igreja. Pena que um número cada vez maior de jovens sacerdotes e religiosos, além de não escutarem o que o Papa diz, não leem também o que ele escreve, perdendo a grande chance de serem fieis à proposta originária de Jesus.

Toda mudança supõe e requer rupturas. Como diria Mahatma Gandhi. “Temos de nos tornar na mudança que queremos ver”. Jesus também encontrou muita resistência por parte daqueles que não aceitavam as mudanças necessárias para caminhar com o povo sofrido de seu tempo. A liturgia desta segunda feira nos traz o texto de Lucas que relata bem a rejeição pela qual Jesus sofreu estando no meio dos seus em Nazaré, sua cidade natal. “Veio para o que era seu, e os seus não o receberam” (Jo 1,11). Diferentemente dos demais evangelistas, Lucas relata que Jesus passou grande parte de sua vida em uma aldeiazinha chamada Nazaré, localizada entre as montanhas da baixa Galileia. Cidade esta localizada em Israel, a 157 quilômetros ao norte de Jerusalém, próximo da divisa com a Síria e o Líbano.

Diante dos seus contemporâneos compatriotas Jesus faz a triste constatação: “Em verdade eu vos digo que nenhum profeta é bem recebido em sua pátria”. (Lc 4,24) O povo pobre e sofrido de Nazaré reproduzindo em si mesmo o pensamento e as ações dos grandes e poderosos da classe dominante de Jerusalém. Os pobres pensando pela cabeça dos ricos, como hoje nos alerta o ex-presidente uruguaio Pepe Mujica: “o pior inimigo de um pobre é outro pobre que se acha rico e que defende aqueles que os tornam pobres”. Mesmo rejeitado pelos seus compatriotas, Jesus segue adiante no seu caminho, para construir a nova história que engloba toda a humanidade: “Jesus, porém, passando pelo meio deles, continuou o seu caminho”. (Lc 4,30)