Francisco (Chico) Machado. Missionário e escritor.

Sexta feira da Solenidade do Coração de Jesus.
Sextou pela última vez em junho, que vai se despedindo aos poucos, passando o bastão para o mês de julho. Meio ano já se foi. Estamos vivendo num ano importante e significativo para os que estamos aqui na Amazônia. 2022 é um ano paradigmático para as populações indígenas, pois há 50 anos, nascia o Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Órgão vinculado a CNBB, com o objetivo específico de lutar pelas causas e direitos dos povos originários, sobretudo quanto à sua autonomia na vivência da sua diversidade cultural, e permanência em seus territórios sagrados. Tudo isso com a participação importante de nosso Pedro, que havia sido ordenado bispo no ano de 1971.

Os povos indígenas não têm muito que comemorar diante do cenário que se descortinou no país nestes últimos anos. Apesar de aqui estarem bem antes da chegada do colonizador, eles são tratados como “inimigos do desenvolvimento”. Tal atitude aponta na direção de que os indígenas tenham a mesma relação que tem o capitalista em relação à terra, vista como objeto de desejo a ser explorado ao máximo, na busca desenfreada por riquezas. Esquecem que os indígenas e a terra são parte integrante de um todo que não há como ser dissociado. “A terra somos nós e sem ela nós não somos”, me disse esta semana um ancião Xavante. Restou-me render ao seu saber ancestral.

Sabedoria que vem de Deus com o seu amor gratuito por todos e cada um de nós. Assim como o amor de Deus é único, nós também somos únicos diante deste seu amor. Ele pensa em cada um de nós. No universo maior da criação, Deus nos vê como seres únicos. Cada um de nós é único para este Deus que nos criou. Por mais que não compreendamos esta unicidade, Ele nos chama pelo nome e tem um apreço especial por cada um de nós. A amorosidade para conosco se faz na unicidade que somos para Ele. O nosso ser neste mundo é obra desta criação de Deus que assim quis nos amar em unicidade de um coração ardente em chamas de amor por nós. No meio da multidão Deus nos vê como únicos. Não nos esqueçamos de que somos especiais demais para Ele, que nos ama com um coração pleno de amorosidade.

Estamos celebrando a festa do Coração amoroso de Jesus. Um coração pleno da divindade em Deus. Um coração humano que se faz divino em plenitude, e vem nos amar por inteiro. Amor de unicidade. Amor de Deus que vem estar no meio de nós, se fazendo conosco e nos elevando a categoria de divinos em Deus. Jesus, o coração de amorosidade de Deus, que se encarna na nossa realidade humana, nos permitindo fazer a experiência mais profunda de estarmos em Deus. Assim como o Pai, o Filho traz em si a unicidade de um amor que se doa plenamente a nós. Em Jesus, o divino de Deus se faz humanidade, engravidando-nos do amor divino de Deus, nos fazendo participar na transcendência de Deus. Como nos disse o escritor russo Leon Tolstói (1828-1910): “Onde há amor, lá Deus está”.

Um coração de Deus que vem busca daquele/a que está perdido/a, como a situação da ovelha “perdida” no deserto, que a liturgia desta sexta feira nos mostra no texto do evangelista Lucas. Um amor de unicidade que deixa as 99 ovelhas de lado e vai atrás daquela que se “desgarrou” das demais. A opção maior é resgatar aquela que está “perdida”, que as demais que estão em segurança. Amor de unicidade que não veio para condenar quem quer que seja, mas buscar aquele e aquela que precisam ser devolvidos à vida e a convivência fraterna.

Deus é amor! Amor de unicidade. Amor de ternura, compaixão e misericórdia. Ama gratuitamente os seus. Amor que se alegra em acolher aquele que errou e busca reparar o seu erro. Amor que fez Jesus estar no meio dos lascados, das prostitutas, dos publicanos, dos cobradores de impostos, dos pagãos, enfim, dos marginalizados, segregados da religião do Templo. Amor de Deus imensurável por aqueles que estão desgarrados, abandonados pela sociedade classista desigual. Coração de Jesus que ama e caminha lado a lado com os pobres. Contemplar o coração amoroso de Jesus é amar como Ele amou. Amar com amor de unicidade. Quanto a isso, João nos dá uma bela dica: “Amados, amemo-nos uns aos outros, pois o amor vem de Deus. E todo aquele que ama, nasceu de Deus e conhece a Deus. Quem não ama não conhece a Deus, porque Deus é amor. Nisto se tornou visível o amor de Deus entre nós: Deus enviou o seu Filho único a este mundo, para dar-nos a vida por meio dele”. (1Jo 4,7-9)