Francisco (Chico) Machado. Missionário e escritor.

Quarta feira da trigésima semana do tempo comum. Vivemos uma semana atípica e cheia de expectativas. O horizonte que se aproxima é de puro esperançamento. Viraremos uma página de nossa história que qualquer historiador, minimamente sério, não gostaria de tê-la escrito. O fundo do poço é bem aqui e nós vamos voltar a sonhar com o renascer da esperança da alegria de voltar a ser feliz de novo. A vida pede passagem como deseja a Organização das Nações Unidas (ONU) que nos propôs a Semana do Desarmamento – 24 a 30 de outubro, como forma de nos desarmarmos do espírito beligerante que ora estamos vivendo. Armas matam pessoas, livros mudam vidas.

Uma proposta que vem na mesma linha de raciocínio daquilo que pensa o nosso pontífice, o Papa Francisco com uma de suas orações: “Senhor, desarmai as línguas e as mãos, renovai os corações e as mentes, para que a palavra que nos faz encontrar seja sempre “irmão”, e o estilo da nossa vida se torne: Shalom, Paz, Salam, Amém! Desarmar não somente das armas literais, mas das armas maiores que alguns trazem dentro de si, com um poder maior de destruição: mentira, ódio, enganação, falsidade. Inveja, ganância, prepotência, arrogância. O Deus que nos criou não nos marcou com o selo da anti-vida e das armas destrutivas, mas com a força do Espírito que renova todas as coisas. “Eis que faço novas todas as coisas”. (Apoc 21,5)

É de todos conhecida a expressão popular “mente (cabeça) vazia, oficina do diabo”. Uma mente cristã que não se ocupa com princípios, valores, perspectivas fundamentadas no Evangelho, torna-se uma sementeira de desesperança. Um desastre. Para isso necessário se faz desenvolver um processo cognitivo que vai desde a formação humana no berço familiar, passando pelo conhecimento adquirido pela escolarização, chegando afinal às boas leituras para apropriar das informações. Informar-se é também adquirir conhecimentos. Todavia, nada disto tem valor se não tiver como objetivo primeiro alcançar a sabedoria, que deve ser colocada a serviço do bem comum de todos. Saber que se faz dom para todos.

Sabedoria que nos faz adentrar a porta da esperança. O caminho estreito, a porta estreita da qual Jesus nos fala através do texto Lucano, proposto pela liturgia para esta quarta feira: “Fazei todo esforço possível para entrar pela porta estreita. Porque eu vos digo que muitos tentarão entrar e não conseguirão”.(Lc13,24). A vida é constituída de decisões, atitudes e escolhas. Uma decisão que se toma no âmbito do “livre arbítrio” que nos torna parte integrante do discipulado de Jesus ou das nossas convicções pessoais, distantes do projeto do Reino. Escolher a porta estreita é estarmos preparados para fazer da vida doação, entrega, serviço aos pequenos, prediletos do Pai. Poucos por esta porta entram, porque o foco principal de sua realização enquanto pessoa humana, passa pelos interesses pessoais egoístas, pelos privilégios estratificando uma sociedade desigual, socialmente injusta.

O sonho de Deus é muito maior do que possamos imaginar. Somos imagem e semelhança do Deus da vida. Ele nos criou para a felicidade plena. Nada de viver pela metade. É assim para todos e todas. A maldade e a desigualdade é fruto das relações humanas estabelecidas na sociedade dos homens. Alguns até pensam que estão cultuando e adorando o mesmo Deus de Jesus de Nazaré, mas estão de braços dados com outros deus, como Moleque, por exemplo, que era um, deus dos Amonitas, especialista em queimar crianças vivas em sacrifícios religiosos. “Deus não é Deus de mortos, mas de vivos, pois todos vivem para ele”. (Lc 20,38)

Atentemo-nos para o contexto de que ora fala o texto do evangelista Lucas. Jesus está entrando pela porta estreita do caminho que leva à Jerusalém. Lucas é um dos evangelistas que detém mais tempo nesta narrativa específica. A porta que se abre para este percurso é o da Paixão, Morte e Ressurreição. Mas é também a porta da esperança e da vida nova. Ele ressurgirá dos mortos. Por mais que algumas interpretações fundamentalistas foquem na porta estreita como caminho para o céu, numa perspectiva escatológica, na verdade trata-se como o caminho que leva à vida no aqui e agora de nossa história. A dimensão escatológica está no sonho de Deus para nós, mas o ser e estar no mundo faz toda a diferença para se chegar posteriormente ao plano salvífico no céu. A salvação vem de Deus e o entrar pela porta da esperança é um dos caminhos que buscamos para chegar até ela. A salvação está aberta para todos, e não só para aqueles que conhecem a Jesus. A condição “sine qua non” é entrar pela porta estreita, isto é, escolher o caminho de vida e da esperança que uma história de novas relações. “Feliz o homem que não vai ao conselho dos injustos, não pára no caminho dos pecadores, nem se assenta na roda dos zombadores”. (Sl 1,1)