Terça feira da quarta semana do tempo comum.

Temos soturnos que nos deixam acabrunhados pelo somar de tantos acontecimentos negativos. Aos mais sensíveis cabe uma sintonia maior com a realidade que nos envolve. Sintonia com a dor e o sofrimento de tantos que, alem da pandemia, estão desabrigados pelas chuvas excessivas que caíram sobre algumas regiões de nosso país. Este é o momento em que a solidariedade fala mais alto, como no caso da Central Única das Favelas (CUFA), organização não governamental, que está se desdobrando na campanha de socorro às famílias desabrigadas. Que lição!

Nossos corações são invadidos por vários tipos de sentimentos. Estes sentimentos são norteados pelo grau de dignidade, pelo caráter e a personalidade daqueles que trazem este órgão vital pulsando no peito. Coração valente! Uns são movidos por sentimentos nobres, outros pelos sentimentos que estão bem abaixo dos valores humanitários. Humanidade que precisa urgentemente ser movida pela empatia, que é a capacidade que desenvolvemos de nos identificarmos com outra pessoa e de sentir o que ela sente. Nestas horas, somos obrigados a concordar com o filósofo suíço Jean-Jacques Rousseau (1712-1778): “O homem que não conhece a dor, não conhece a ternura da humanidade”.

Rezei nesta manhã na companhia dos poucos visitantes que se fizeram presentes em meu quintal. A chuva fina e o clima fresquinho os intimidaram de vir comigo rezar. Uma frase veio a tona, fazendo realçar meu esquema mental: “Nunca se arrependa do bem que fez, mesmo que se depare com a ingratidão”. Não sei de quem é a referida frase, mas ela faz sentido, sobretudo no atual contexto em que estamos vivendo. Todavia, dei-me o direito de completar tal frase, acrescentando de minha parte: “arrependa-se tão somente daquilo que deveria ter feito, mas que não o fez enquanto era tempo. Inevitável pensar naquilo que fora dito pelo filósofo renascentista francês Francois Rabelais (1494-1553): ”Conheço muitos que não puderam quando deviam, porque não quiseram quando podiam.“

A liturgia que nos é proposta para o dia de hoje nos faz pensar. Jesus com as suas travessuras, afrontando as lideranças religiosas e fazendo acontecer os seus sinais em benefício dos mais necessitados. Desta vez, Ele está na outra margem e duas mulheres necessitam de sua intervenção como Messias libertador a que veio: uma mulher padecendo de uma hemorragia crônica e uma criança no seu leito de morte prematura. Ambas mulheres, “seres inferiores” para aquela sociedade do tempo de Jesus. Além de mulher, uma delas era discriminada duplamente, já que com o seu sangramento, era considerada impura (Lv 15,19.25). Não podia ser tocada e nem tocar em ninguém. A segunda, uma criança e as crianças não gozavam nenhum prestígio.

Jesus se deixa tocar e faz questão de anunciar que fora tocado por uma mulher “impura”. Chama também a nossa atenção a fé daquela mulher. Uma pessoa de uma profunda fé, que a faz violar a Lei, assumindo o risco de ser morta ao tocar em Jesus. Tudo no intuito de ser curada e voltar a sua convivência com as demais pessoas, já que era excluída do convívio social. A missão salvífica e libertadora de Jesus não se restringe em fazer a “Missa de Cura”, mas de libertar integralmente as pessoas, promovendo o seu retorno à vida em sociedade, sem os trágicos preconceitos, discriminação e desigualdade social, promovidas pela sociedade dos lucros fartos , do consumo exacerbado e da exploração.

Da mesma forma a criança, com a sua morte prematura, vítima de um sistema que fabrica a mortalidade infantil de centenas de milhares de seres inocentes como aquela criança do texto bíblico. E não adianta vir com a ideia da “predestinação”, como alguns querem nos fazer acreditar de que: “morreram os que tinham que morrer”. No Reino querido e sonhado por Deus para os seus, vale aquilo que fora dito pelo Profeta Isaías: Aí não haverá mais crianças que vivam alguns dias apenas, nem velhos que não cheguem a completar seus dias, pois será ainda jovem quem morrer com cem anos” (Is 65, 20) Que possamos também nós, sermos tocados por Jesus para curar-nos de nossas enfermidades, sobretudo daquelas que nos fazem ficar acomodados e instalados em nossos falsos pedestais.

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