Francisco (Chico) Machado. Escritor e missionário.

Festa do Batismo do Senhor.

Um momento especial na vida de Jesus que se submete ao Batismo realizado pelo profeta João Batista. Aos pouquinhos a proposta de Encarnação do Verbo, vai ganhando consistência histórica, e nos fazendo experimentar a presença do Deus vivo entre nós. Deus que na sua gratuidade, nos dá o Filho, tomando a iniciativa de vir morar em nossa realidade humana. Um Deus divino se fazendo humano como nós e para nós. Como afirmava Santo Atanásio: “Toda a graça que nos é dada na Trindade nos é dada pelo Pai, através do Filho, no Espírito Santo”. Em Jesus, Deus se faz gratuidade e se dá todo inteiro à nós…

A Igreja está em festa. Na cena do Batismo, o Pai reconhece o Filho e o dá a revelar a nós: “Este é o meu Filho amado”. Em Jesus é selada a Nova Aliança entre Deus e a humanidade, porque Ele vai unir ao coração amoroso do Pai todos nós filhos e filhas. Em solidariedade a todo o povo, Jesus começa o período de batismo no Espírito, construindo uma nova história da caminhada do povo de Deus. Com Jesus e por Ele, também nós podemos ouvir a voz de Deus, que se expressa no mais íntimo de nosso ser: “Tu és o meu Filho amado”.

Rezei nesta manhã, embalado pela chuva mansa, que se fez presente por toda a noite. Um silêncio comovente, pairava sobre o meu quintal. Nenhum dos meus visitantes deu o ar da graça nesta manhã. A chuva os inibiu de deixar seus ninhos, aquecidos pelo carinho de Deus que também se faz com eles. Apenas os pingos da chuva ditavam as notas musicais de uma manhã sinfônica da mãe natureza. Como não louvar e bendizer a Deus pela sua obra? Este cenário me fez lembrar de uma das observações feitas pelo ancião Xavante Francisco Tsipé. “É preciso estar atento para escutar o pulsar do coração da Mãe Terra”.

A Mãe terra é a fonte de nossa subsistência. Tudo dela recebemos. Ela se faz gratuidade em nos prover do necessário para viver, e bem viver! Mesmo que a nossa relação com ela não passe por este viés. Somos ingratos o bastante para devolver em forma de agressão e destruição, numa atitude autoritária de quem se coloca como os principais seres, sem levar em consideração todos os demais seres que habitam o planeta. Por este motivo estamos pagando um alto preço pela nossa auto-suficiência irresponsável. O consumo desenfreado deu lugar a uma relação que poderia ser de sinergia e de mútua cooperação entre todos os seres que aqui estamos nesta Casa Comum.

Se João Batista convida seus seguidores para fazer uma mudança radical de vida, a nova história iniciada com Jesus transformará pela raiz as relações entre as pessoas. Pelo batismo, também nós passamos a fazer parte desta nova história. Ele é o sacramento que nos abre a porta de entrada da vida em comunidade, para assim fazermos a nossa caminhada de fé, junto dos irmãos e irmãs. Um sacramento todo especial, pois através dele, aceitamos caminhar com o próprio Jesus, dando continuidade à sua missão libertadora.

Nos primórdios do cristianismo, quem se batizava colocava a sua cabeça a prêmio. Muitos perderam a vida por assumir esta atitude. Os “donos do poder”, não se contentaram em matar Jesus, mas estendeu a perseguição aos seus seguidores, tirando-lhes a vida. Portanto, a perseguição faz parte do itinerário vivido pelos seguidores do Mestre Galileu. Neste sentido, a fé daquele e daquela que assume em si o batismo, não se traduz em algo teórico, marcado pelo sentimento de boas intenções, mas se faz nas ações concretas que vamos assumindo na caminhada de comunidade dos batizados. Ou seja, ser com Jesus e como Ele é arriscado! Comungar dos ideais de Jesus, compromete. Como bem diz uma das canções que muito cantamos em nossas comunidades:

“Comungar é tornar-se um perigo, viemos pra incomodar” https://www.youtube.com/watch?v=ASxvQXBGxoI

Esta é a dimensão revolucionária do batismo que celebramos hoje. Precisamos retomar o real sentido deste sacramento comprometedor, que ao longo da nossa caminhada de Igreja foi se perdendo, esvaziando-se. Mais do que uma celebração de cunho meramente social para as famílias, ele se transforma na porta de abertura para a adesão ao Projeto de Deus revelado por Jesus de Nazaré. Projeto este que vai sendo desenhado na caminhada itinerante da comunidade que busca construir o Reino, pela ação concreta de cada um e cada uma que faz parte desta comunidade. Que o Espírito nos faça comprometidos/as com as causas de Jesus!